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Astrônomos Usam Técnica de Inteligência Artificial Para Classificar A Forma das Galáxias

Um grupo de pesquisadores, consistindo principalmente de astrônomos do National Astronomical Observatory do Japão, o NAOJ, realizaram uma classificação morfológica de 560 mil imagens de galáxias, obtidas com a câmera de campo ultra vasto do Telescópio Subaru, e para isso eles usaram técnicas de inteligência artificial, e conseguiram uma acurácia de 97.5% na classificação automática de galáxias espirais. O grupo agora tem como objetivo fazer uma classificação morfológica muito mais extensa das galáxias usando a grande quantidade de dados astronômicos e realizando também uma colaboração com um grupo de cientistas cidadãos.

Há cerca de 100 anos, o astrônomo americano Edwin Hubble descobriu que vários tipos de galáxias podem existir no universo, desde as belas espirais até galáxias elípticas gigantescas. O universo contendo esses diferentes tipos de galáxias, é como se fosse um verdadeiro zoológico de galáxias. Um dos maiores enigmas na astronomia galáctica é como essa população de galáxias nasceu e evoluiu com o passar do tempo.

Para tentar entender isso é preciso estudar, classificar e analisar o maior número possível de galáxias. Mas essa não é uma tarefa muito fácil, existem trilhões de galáxias no universo observável e saber a sua forma é um grande desafio. Assim, um grupo de astrônomos do National Astronomical Observatory do Japão, o NAOJ, aplicou uma técnica de deep-learning, que é uma das técnicas fundamentais para a inteligência artificial, em uma grande base de dados de imagens de galáxias obtidas por uma grande pesquisa que durou 300 noites de observação dentro do Subaru Strategic Program, usando para isso a câmera de campo ultra vasto do telescópio conhecida como Hyper Suprime-Cam, ou HSC, instalada no foco primário do Telescópio Subaru. Com essa base de dados os astrônomos realizaram uma classificação automática das galáxias, de acordo com a sua morfologia e conseguiram uma acurácia de 97.5% no resultado final. De acordo com os padrões espirais foram identificadas cerca de 80 mil galáxias. A maioria delas foram encontradas no universo distante, a mais de 2.5 bilhões de anos-luz de distância da Terra.

Os padrões espirais dessas galáxias distantes não eram identificados nos dados de uma grande busca de galáxias, realizada pelo Sloan Digital Sky Survey, que usa um telescópio de 2.5 metros. Contudo, eles foram observados de forma clara nas imagens obtidas pela HSC, que tem uma resolução 2 vezes maior, e uma sensibilidade 36 vezes maior. Graças a essa alta sensibilidade, cerca de 560 mil galáxias foram detectadas nas imagens da HSC. Agora, imagina você, começar a analisar visualmente galáxia por galáxias dessas quase 600 mil e fazer uma classificação morfológica de cada uma delas, seria algo inimaginável. E é aí que entra a técnica de deep-learning, que permite uma classificação automatizada sem a intervenção humana.

A razão porque o ser humano consegue reconhecer, por exemplo, um gato, quando vê a imagem de um gato, é porque ele consegue reconhecer feições específicas, como os olhos, o nariz, o rabo, entre outras, com isso, fazemos um julgamento com base na nossa experiência e no conhecimento e assim podemos dizer que é um gato. No caso de técnicas de deep-learning é basicamente a mesma coisa, ocorre a extração e o julgamento de determinadas feições, uma das técnicas mais utilizadas são as redes neurais convolucionais. Nessa técnica, não se usa a imagem bruta, mas a imagem é processada, passando por várias operações de convolução, isso serve para reduzir a quantidade de informação, deixando apenas feições bem características dos objetos, que então são usadas para serem classificadas. Essas técnicas veem se desenvolvendo muito desde 2012 e são usadas atualmente para várias aplicações, como câmeras de segurança, sistemas de automação de veículos e muitas outras. O Dr. Ken-ichi Tadaki, um Professor Assistente no NAOJ, teve uma ideia que se essas técnicas de processamento automático de imagens podem ser usadas parra classificar imagens de cachorros e gatos, elas podem ser capazes de classificar padrões espirais de galáxias e padrões de galáxias elípticas, de maneira similar. Com isso teve início o projeto Subaru Galaxy Zoo, onde técnicas de deep-learning  são aplicadas a um grande conjunto de dados obtidos pelo Telescópio Subaru para classificar a morfologia das galáxias.

Nesse estudo, o grupo de pesquisa classificou as galáxias em três classes, as galáxias espirais na forma de S, as galáxias espirais na forma de Z e as galáxias sem padrão espiral. A rotação das galáxias em forma de S e em forma de Z são opostas uma em relação a outra. Assim, estudando a distribuição das galáxias em forma de S e Z, nós estamos estudando a distribuição das rotações no universo. E isso serve para que? Com essa informação os astrônomos podem ter uma ideia se o universo é verdadeiramente isotrópico e uniforme como se acredita comumente.

Além disso, é possível estender esse trabalho para classificar galáxias em classes mais detalhadas, para isso é preciso treinar a inteligência artificial com um número substancial de galáxias classificadas primeiro pelo ser humano. Para isso o NAOJ está executando o projeto chamado de Galaxy Cruise, um projeto de ciência cidadã, onde as pessoas examinam imagens de galáxias obtidas com o Telescópio Subaru, procurando por feições que sugerem colisão ou fusão de galáxias e as classificam como galáxias dde anel e galáxias com caudas. O orientador do projeto Galaxy Cruise, o Professor Associado Masayuki Tanaka tem uma grande esperança nesse estudo usando inteligência artificial. Os dados da HSC no Strategic Program do Subaru são realmente grandes e possuem quase que um número incontável de imagens de galáxias próximas e distantes.  Cientificamente falando é muito interessante verificar essa base de dados usando a colaboração de cientistas cidadãos e da máquina. Empregando as técnicas de deep-learning com base nas classificações feitas por cientistas cidadãos, no Galaxy Cruise, as chances são de encontrar um grande número de galáxias em colisão e em fusão.

Tudo isso pode ser visto como um preparativo para o que vem pela frente. Em 2022 entra em operação no Subaru um novo espectrógrafo de múltiplos objetos e de campo ultra vasto, com isso será feita uma pesquisa de grande escala para medir a distância das galáxias. Assim, sabendo a distância da galáxia e conhecendo a sua morfologia é possível dizer quantos bilhões de anos levaram para a galáxia chegar até onde ela está e entender como a morfologia dela evoluiu com o passar do tempo.

Fonte:

https://subarutelescope.org/en/results/2020/08/10/2884.html

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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