O Cinturão de Kuiper, localizado na borda do nosso Sistema Solar, é uma região vasta e repleta de inúmeros objetos gelados. Este cinturão tem se revelado uma fonte inestimável de descobertas científicas, desvendando mistérios que antes permaneciam ocultos aos olhos da ciência. A detecção e caracterização dos Objetos do Cinturão de Kuiper (KBOs), também conhecidos como Objetos Transnetunianos (TNOs), proporcionaram uma compreensão renovada sobre a história e evolução do nosso Sistema Solar.
A disposição destes KBOs é um indicativo das correntes gravitacionais que moldaram o Sistema Solar ao longo de bilhões de anos. Estas correntes revelam uma história dinâmica, marcada por migrações planetárias e interações gravitacionais. Desde o final do século XX, com os avanços tecnológicos em astronomia, os cientistas têm buscado examinar mais de perto os KBOs, com o objetivo de entender melhor suas órbitas, composições e potencial para abrigar formas de vida.
Neste contexto, o Telescópio Espacial James Webb (JWST) surge como uma ferramenta revolucionária. Um dos seus principais objetivos é estudar corpos no Sistema Solar externo. Utilizando dados obtidos pelo Espectrômetro de Infravermelho Próximo (NIRSpec) do JWST, uma equipe internacional de astrônomos, liderada por Joshua Emery, Professor Associado de Astronomia e Ciências Planetárias da Universidade do Norte do Arizona, observou três planetas anões no Cinturão de Kuiper: Sedna, Gonggong e Quaoar.
Estas observações, realizadas em colaboração com instituições renomadas como o Centro de Voo Espacial Goddard da NASA e a Universidade Cornell, revelaram detalhes fascinantes sobre as órbitas e composições destes corpos celestes. Entre as descobertas mais notáveis, destaca-se a presença de hidrocarbonetos leves e moléculas orgânicas complexas, que se acredita serem produtos da irradiação do metano.
Apesar dos avanços significativos em astronomia e da introdução de exploradores robóticos, nosso conhecimento sobre a Região Transnetuniana e o Cinturão de Kuiper ainda é limitado. Até o momento, a única missão que estudou Urano, Netuno e seus principais satélites foi a missão Voyager 2, que sobrevoou estes gigantes gelados em 1986 e 1989. Além disso, a missão New Horizons, em 2015, foi pioneira ao estudar Plutão e seus satélites, e posteriormente, em 2019, ao encontrar um objeto no Cinturão de Kuiper, conhecido como Arrokoth.
A antecipação pelo lançamento do JWST não era sem motivo. Além de sua capacidade de estudar exoplanetas e as primeiras galáxias do Universo, o JWST possui poderosas capacidades de imagem em infravermelho. Estas capacidades têm sido utilizadas para revelar novas imagens de corpos celestes mais próximos, como Marte e Júpiter, bem como seus maiores satélites.
Emery e sua equipe, ao analisar os dados do JWST, concentraram-se em três planetoides no Cinturão de Kuiper. Estes corpos, com cerca de 1.000 km de diâmetro, são especialmente interessantes para os astrônomos devido ao seu tamanho, órbitas e composições. Outros corpos Transnetunianos, como Plutão e Eris, retiveram gelos voláteis em suas superfícies. No entanto, Haumea é uma exceção, tendo perdido seus voláteis devido a um grande impacto.
A equipe de Emery utilizou o NIRSpec do JWST para observar estes corpos em diferentes espectros. As observações revelaram a presença abundante de etano em todos os três corpos, com Sedna também mostrando acetileno e etileno. Estas moléculas são produtos diretos da irradiação do metano. Estudos recentes, liderados pelo Dr. Will Grundy e Chris Glein, corroboram estas descobertas, sugerindo que o metano não é primordial, mas sim processado internamente e depois entregue à superfície.
Estas descobertas têm implicações significativas para o estudo de KBOs, TNOs e outros objetos no Sistema Solar externo. Elas fornecem novos insights sobre a formação de objetos além da Linha de Frost, uma região no Sistema Solar onde compostos voláteis se solidificam. Emery destaca que os resultados também demonstram os processos evolutivos em ação nesta região, desde a reprocessamento de gelos primordiais até a possibilidade de atmosferas nesses corpos.
Finalmente, os resultados deste estudo reafirmam as capacidades do JWST, que tem provado seu valor repetidamente desde que se tornou operacional. Emery elogia a qualidade dos dados obtidos pelo JWST, destacando sua capacidade de fornecer espectros em comprimentos de onda mais longos do que as observações baseadas em terra. O JWST não apenas abriu um novo espectro de comprimento de onda, mas também forneceu dados de alta qualidade, sensíveis a uma variedade de materiais nas superfícies do Sistema Solar externo.
Fonte:
https://www.universetoday.com/163483/jwst-observes-the-kuiper-belt-sedna-gonggong-and-quaoar/