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21 de novembro de 2024

Terremotos Estelares Podem Explicar as FRBs

Os rápidos e misteriosos pulsos conhecidos como Fast Radio Bursts (FRBs) têm intrigado astrônomos e cientistas desde a sua descoberta em 2007. Estes pulsos, invisíveis ao olho humano, manifestam-se como intensos surtos de energia radiofônica, brilhando com destaque nos radiotelescópios. Apesar de sua brevidade, durando apenas milésimos de segundo, sua potência é inegável, com a capacidade de viajar bilhões de anos-luz.

O vasto universo, com seus inúmeros enigmas, sempre despertou a curiosidade humana. Graças aos avanços tecnológicos, hoje, mesmo da Terra, podemos explorar a superfície de Marte, admirar os anéis de Saturno e captar sinais misteriosos do espaço profundo. E, entre esses sinais, os FRBs destacam-se por sua potência e singularidade. Estima-se que, se pudéssemos observar todo o céu, presenciaríamos até 10.000 FRBs diariamente. Embora a maioria dos FRBs detectados até agora pareça ser eventos únicos, existem cerca de 50 fontes de FRB que emitem pulsos repetidamente.

A causa exata dos FRBs ainda é desconhecida. Algumas teorias especulativas sugerem até mesmo uma origem alienígena. No entanto, a teoria predominante atualmente aponta para as estrelas de nêutrons como possíveis emissores de alguns desses FRBs. As estrelas de nêutrons são formadas a partir do colapso de estrelas supergigantes. Estas, apesar de possuírem uma massa até oito vezes superior à do nosso Sol, colapsam para formar um núcleo superdenso com apenas 20-40 quilômetros de diâmetro.

Dentro desta categoria de estrelas de nêutrons, encontram-se os magnetars, caracterizados por seus campos magnéticos extremamente fortes. Observações recentes identificaram magnetars como emissores de FRBs. O Professor Tomonori Totani, do Departamento de Astronomia da Universidade de Tóquio, postulou que a superfície de um magnetar poderia experimentar um “starquake”, um fenômeno energético similar aos terremotos na Terra.

Aproveitando os avanços observacionais que levaram à detecção de milhares de FRBs adicionais, Totani e sua equipe decidiram comparar os dados estatísticos disponíveis dos FRBs com dados de terremotos e erupções solares. Enquanto análises anteriores dos FRBs se concentravam principalmente na distribuição de tempos de espera entre dois surtos sucessivos, Totani e seu coautor, Yuya Tsuzuki, adotaram uma abordagem mais abrangente. Eles analisaram a correlação no espaço bidimensional, considerando o tempo e a energia de emissão de quase 7.000 surtos de três diferentes fontes repetidoras de FRB.

Para aprofundar a análise, a equipe também examinou a correlação tempo-energia de terremotos, utilizando dados do Japão, e de erupções solares, com registros da missão internacional Hinode. Os resultados foram reveladores. Contrariando estudos anteriores, a análise de Totani e Tsuzuki mostrou uma semelhança notável entre os FRBs e os dados sísmicos dos terremotos, mas uma diferença clara em relação às erupções solares.

Esses achados sugerem fortemente a existência de uma crosta sólida na superfície das estrelas de nêutrons. Os “starquakes” que ocorrem nessas crostas liberariam imensas quantidades de energia, que percebemos como FRBs. Além disso, os resultados indicam que a probabilidade de um aftershock (réplica) após um evento é de 10-50%. A taxa de ocorrência desses aftershocks diminui com o tempo e não há correlação entre as energias do choque principal e seu aftershock.

A pesquisa da Universidade de Tóquio não apenas fortalece a teoria dos “starquakes” como origem dos FRBs, mas também abre portas para uma compreensão mais profunda dos terremotos na Terra. Como Totani observou, o interior de uma estrela de nêutrons é o lugar mais denso do universo, comparável ao interior de um núcleo atômico. Assim, os “starquakes” em estrelas de nêutrons oferecem a possibilidade de obter novos insights sobre matéria de alta densidade e as leis fundamentais da física nuclear.

Em conclusão, a busca para desvendar os mistérios dos FRBs continua, mas o estudo da Universidade de Tóquio fornece um caminho promissor. Através da intersecção da astrofísica, geofísica e física nuclear, podemos estar à beira de compreender não apenas os enigmas do espaço, mas também os fenômenos terrestres que nos afetam diretamente. A pesquisa de Totani e Tsuzuki é um testemunho do poder da abordagem interdisciplinar e da incessante busca humana pelo conhecimento.

Fonte:

https://www.u-tokyo.ac.jp/focus/en/press/z0508_00312.html

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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