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Sonda New Horizons da NASA Conduz O Primeiro Experimento de Paralaxe Interestelar

Pela primeira vez na história, uma sonda enviou fotos do céu, de um lugar tão longe da Terra, que as estrelas aparecem em posições diferentes, daquelas que observamos daqui.

A mais de 6 bilhões de quilômetros de casa, e viajando em direção ao espaço interestelar, a sonda New Horizons viajou para tão longe que agora ela tem a sua própria visão das estrelas mais próximas, uma visão diferente daquela que temos daqui do nosso planeta. Podemos dizer que a sonda New Horizons está olhando para um céu alienígena, um céu diferente do nosso. E isso tem permitido os pesquisadores a fazer algo que eles nunca tinham realizado antes, ver as estrelas mais próximas visivelmente separadas no céu das posições nós as observamos da Terra.

Nos dias 22 e 23 de abril de 2020, a sonda virou sua câmera telescópica de longo alcance para um par de estrelas próxima, a Proxima Centauri e a Wolf 359, mostrando como elas aparecem em posições diferentes no céu. Os cientistas já usam efeito há muito tempo, é o chamado efeito de paralaxe, que eles usam para medir as distâncias até as estrelas, observando o quanto elas aparecem em posições diferentes do céu com relação a um fundo de estrelas quando observadas de pontos diferente, e normalmente se usa a órbita da Terra. Assim, uma estrela tem a sua posição anotada numa determinada data, e 6 meses depois ela observada novamente e mais uma vez tem a sua posição determinada, a partir das diferenças medida em ângulos e sabendo a órbita da Terra é possível estimar a distância até uma determinada estrela.

Mas você não precisa esperar 6 meses para experimentar a paralaxe, basta colocar seu dedo na frente do sou rosto, com o braço esticado e observar a posição do seu dedo contra um fundo conhecido com um olho e depois com outro. No caso, das estrelas, mesmo as mais próximas da Terra, estão a uma distância tão grande de nós que o diâmetro da órbita da Terra, não permite que possamos ver essa diferença a olho nu, precisando para isso de instrumentos de alta precisão. O olho humano não pode detectar essa mudança.

Mas quando as imagens feitas pela New Horizons são comparadas com as imagens feitas das mesmas estrelas na mesma data, por telescópios na Terra, o desvio da paralaxe é visível de forma instantânea. É possível ver a posição das estrelas variando com relação ao fundo estrelado mais distante.

O experimento feito com a sonda New Horizons forneceu a maior linha de base de um experimento de paralaxe já realizado, cerca de 6 bilhões de quilômetros, e pela primeira vez na história foi possível observar de forma fácil e notável a paralaxe estelar.

A New Horizons realmente é uma missão destinada à realizar coisas inéditas em toda a sua viagem, foi a primeira missão a passar por Plutão, a primeira missão a passar por um segundo objeto no Cinturão de Kuiper, e agora a primeira missão a poder mostrar a paralaxe estelar para todos nós.

Uma curiosidade, que acho que poucos sabem, mas vou contar aqui para vocês. O guitarrista do Queen, o Brian May é doutor em astrofísica, uma de suas especialidades é criar imagens estereográficas a partir de duas imagens feitas de um ponto de vista um pouco diferente. Ele já fez isso com imagens de asteroides, cometas entre outros objetos. E nesse caso não foi diferente, então se você for no site da NASA poderá ver a imagem estereográfica criada pelo Brian May para essa paralaxe estelar.

O Brian May chegou a dizer que quando o assunto é imagens estereográficas de objetos astronômicos, a equipe da New Horizons lidera o campo, já entregando imagens estereoscópicas espetaculares tanto de Plutão, como do objeto do Cinturão de Kuiper, conhecido como Arrokoth. Mas essas últimas imagens do experimento de paralaxe da New Horizons quebrou todos os recordes. Essas fotografias de Proxima Centauri e da Wolf 359, estrelas que são bem conhecidas pelos astrônomos amadores e pelos aficionados em ficção científica, empregou a maior distância entre dois pontos já obtida em 180 anos de experimentos de estereoscopia.

As imagens terrestres, usadas para serem comparadas com as imagens obtidas pela sonda New Horizons foram feitas pelo Observatório de Las Cumbres, operando um telescópio remoto no Observatório de Siding Spring na Austrália, que fizeram imagens de Proxima Centauri, além disso foram usadas imagens feitas por astrônomos que operaram de forma remota o Observatório de Monte Lemmon no Arizona, para as imagens da Wolf 359.

As comunidades de astrônomos amadores e profissionais estavam esperando por isso, e ficaram muito animados por terem feito parte um pouco da história da exploração espacial. As imagens coletadas da Terra, quando a New Horizons estava observando as estrelas Proxima Centauri e Wolf 359 excederam as expectativas até dos mais exigentes astrônomos.

No decorrer da história, os navegadores usaram medidas das estrelas para estabelecer suas posições na Terra. Os navegadores interestelares, podem fazer o mesmo estabelecendo suas posições na galáxia, usando uma técnica que a New Horizons demonstrou agora pela primeira vez. Por enquanto um primeiro ganho direto desse experimento é tornar o rastreio feito pela Deep Space Network mais preciso, mas com o passar dos anos esse tipo de experimento poderá, quem sabe, ajudar a exploração humana da nossa galáxia.

No momento das observações, a sonda New Horizons estava a mais de 7 bilhões de quilômetros da Terra, onde o sinal de rádio viajando na velocidade da luz, precisa de um pouco menos de 6 horas e 30 minutos para chegar até na Terra.

Como eu já falei aqui, mas só para lembrar, quem não sabe, a sonda New Horizons foi lançada para o espaço em 2006, e foi a primeira missão espacial a visitar Plutão e o Cinturão de Kuiper. Uma curiosidade, quando a sonda foi lançada, Plutão ainda era planeta. A sonda passou por Plutão no ano de 2015, completando a exploração de todo o Sistema Solar que havia começado 50 anos antes. Mas ela não parou por aí, ela continuou sua exploração no Sistema Solar passando pelo objeto até então conhecido como Ultima Thule e depois renomeado para Arrokoth, no histórico dia 1 de janeiro de 2019. A New Horizons segue viajando pelo Cinturão de Kuiper e existem estudos para fazer com que ela passe por um terceiro objeto, mas isso ainda não foi confirmado.

Uma missão espacial tão esperada, já que toda a equipe está envolvida com isso desde a década de 1990 e que com certeza continuará fazendo história por alguns anos, seguindo os mesmos destinos das missões Voyager e Pioneer.

Fonte:

https://www.nasa.gov/feature/nasa-s-new-horizons-conducts-the-first-interstellar-parallax-experiment

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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