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Revelando o Verdadeiro Formato da Galáxia M87

Embora vivamos em um vasto universo tridimensional, os objetos celestes vistos através de um telescópio parecem planos porque estão muito distantes. Pela primeira vez, astrônomos mediram a forma tridimensional de uma das maiores e mais próximas galáxias elípticas de nós, a M87. Esta galáxia se revelou “triaxial” ou em formato de batata. Essa visão estereoscópica foi possibilitada pela combinação do poder do Telescópio Espacial Hubble da NASA e do Observatório W. M. Keck, localizado no Havaí.

Na maioria dos casos, os astrônomos precisam usar sua intuição para entender as verdadeiras formas dos objetos espaciais profundos. Por exemplo, a classe inteira de galáxias enormes chamadas de “elípticas” parece manchas nas imagens. Determinar a verdadeira forma das galáxias elípticas gigantes ajudará os astrônomos a entender melhor como as grandes galáxias e seus buracos negros centrais se formam.

Os cientistas criaram o modelo 3D medindo os movimentos das estrelas que se aglomeram em torno do buraco negro supermassivo central da galáxia. O movimento estelar foi usado para fornecer novos insights sobre a forma da galáxia e sua rotação, além de permitir uma nova medição da massa do buraco negro. Rastrear as velocidades e posições estelares permitiu aos pesquisadores construir uma visão tridimensional da galáxia.

Astrônomos da Universidade da Califórnia em Berkeley conseguiram determinar a massa do buraco negro no núcleo da galáxia com alta precisão, estimando-a em 5,4 bilhões de vezes a massa do Sol. As observações do Hubble em 1995 mediram o buraco negro da M87 como sendo 2,4 bilhões de massas solares. Já em 2019, a colaboração internacional do Event Horizon Telescope lançou a primeira imagem do mesmo buraco negro, permitindo calcular sua massa em 6,5 bilhões de massas solares usando a teoria da relatividade geral de Einstein.

O modelo estereoscópico da M87 e a massa mais precisa do buraco negro central podem ajudar os astrofísicos a aprender a taxa de rotação do buraco negro. “Agora que conhecemos a direção da rotação líquida das estrelas na M87 e temos uma massa atualizada do buraco negro, podemos combinar essas informações com os dados do Event Horizon Telescope para restringir a rotação”, disse Chung-Pei Ma, investigador principal da UC Berkeley.

Com mais de dez vezes a massa da Via Láctea, a M87 provavelmente cresceu a partir da fusão de várias outras galáxias. Essa é provavelmente a razão pela qual o buraco negro central da M87 é tão grande – ele assimilou os buracos negros centrais de uma ou mais galáxias que engoliu.

Ma, juntamente com a estudante de doutorado da UC Berkeley, Emily Liepold (autora principal do artigo publicado no Astrophysical Journal Letters) e Jonelle Walsh, da Texas A&M University, conseguiram determinar a forma 3D da M87 graças a um novo instrumento de precisão montado no Telescópio Keck II. Eles apontaram o Keck para 62 localizações adjacentes da galáxia, mapeando o espectro das estrelas em uma região de cerca de 70.000 anos-luz de diâmetro. Essa região abrange os 3.000 anos-luz centrais, onde a gravidade é amplamente dominada pelo buraco negro supermassivo. Embora o telescópio não consiga resolver estrelas individuais devido à grande distância da M87, os espectros podem revelar a gama de velocidades para calcular a massa do objeto em órbita.

“É como olhar para um enxame de 100 bilhões de abelhas”, disse Ma. “Embora estejamos olhando para elas de longe e não possamos distinguir abelhas individuais, estamos obtendo informações muito detalhadas sobre suas velocidades coletivas.” Os pesquisadores coletaram os dados entre 2020 e 2022, bem como medições anteriores de brilho estelar da M87 feitas pelo Hubble, e as compararam com previsões de modelos de computador de como as estrelas se movem em torno do centro da galáxia em formato triaxial. O ajuste mais adequado a esses dados permitiu calcular a massa do buraco negro.

Na década de 1920, o astrônomo Edwin Hubble classificou as galáxias de acordo com suas formas. Galáxias espirais em forma de disco plano poderiam ser vistas em vários ângulos de projeção no céu: de frente, oblíquas ou de canto. No entanto, as galáxias “de aparência irregular” eram mais problemáticas para caracterizar. Hubble criou o termo “elípticas”. Elas só poderiam ser classificadas de acordo com o grau de elipticidade. Não possuíam poeira ou gás aparente em seu interior para melhor distingui-las. Agora, um século depois, os astrônomos têm uma visão estereoscópica de uma galáxia elíptica prototípica.

O Telescópio Espacial Hubble é um projeto de cooperação internacional entre a NASA e a ESA. O Goddard Space Flight Center da NASA em Greenbelt, Maryland, gerencia o telescópio. O Space Telescope Science Institute (STScI), em Baltimore, Maryland, conduz as operações científicas do Hubble e do Webb. O STScI é operado pela NASA pela Association of Universities for Research in Astronomy, em Washington, D.C.

A descoberta da forma tridimensional da galáxia M87 é um marco na astronomia moderna, pois ela fornece uma visão mais precisa e abrangente das formas das galáxias elípticas, além de revelar informações valiosas sobre a massa e rotação de buracos negros supermassivos. Através dessa descoberta, astrônomos e astrofísicos podem expandir seu conhecimento sobre a formação e evolução das galáxias, bem como entender melhor os processos dinâmicos que ocorrem no universo.

A combinação de dados do Hubble e do Observatório W. M. Keck permitiu que os pesquisadores desvendassem os mistérios da M87, mostrando a importância da colaboração internacional e do uso de várias técnicas e instrumentos em pesquisa astronômica. O trabalho pioneiro de Edwin Hubble no início do século XX proporcionou uma base sólida para o estudo das galáxias, e as descobertas recentes, como a forma tridimensional da M87, continuam a expandir e aprimorar nossa compreensão do cosmos.

À medida que a tecnologia e os instrumentos astronômicos continuam a avançar, é provável que mais descobertas e informações sobre as galáxias elípticas e outras formas de galáxias sejam reveladas. Essas informações não apenas enriquecem nosso conhecimento sobre a natureza do universo, mas também podem ter implicações práticas na busca por recursos e na exploração espacial no futuro.

Em resumo, a descoberta da forma tridimensional da galáxia M87 marca um avanço significativo na astronomia e astrofísica, oferecendo uma visão mais completa das galáxias elípticas e dos processos que ocorrem no universo. Essa descoberta destaca a importância da colaboração e da inovação na pesquisa astronômica e abre caminho para futuras descobertas e avanços no campo.

Fonte:

https://www.nasa.gov/feature/goddard/2023/giant-galaxy-seen-in-3d-by-nasas-hubble-space-telescope-and-keck-observatory

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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