No dia 31 de Março de 2017, o satélite Europa de Júpiter passou na frente de uma estrela de fundo, um evento raro que foi registrado pela primeira vez por telescópios em terra graças aos dados fornecidos pela missão Gaia da ESA.
Anteriormente, os observatórios tinham conseguido observar somente dois outros satélites de Júpiter, em um evento parecido com esse, Io e Ganimedes.
A missão Gaia está em operação no espaço desde o final de 2013. A missão tem como objetivo principal construir um mapa tridimensional da nossa galáxia, e caracterizar a miríade de estrelas que formam a Via Láctea. Até agora ela tem realizado com sucesso a sua missão, revelando a posição precisa e o movimento de mais de um bilhão de estrelas.
Conhecendo a localização precisa das estrelas que nós observamos no céu, é possível prever quando os vários corpos do nosso Sistema Solar irão passar na frente de uma dessas estrelas, de um ponto de vista vantajoso, em um evento que chamamos de ocultação estelar.
A missão Gaia não é estranha com esse tipo de evento, a sonda já ajudou os astrônomos a realizarem observações únicas do satélite Tritão de Netuno passando na frente de uma estrela distante em 2017, revelando mais sobre a atmosfera e as propriedades do satélite.
As ocultações estelares são fenômenos altamente valiosos para os astrônomos: elas permitem medir as características do corpo que está em primeiro plano, como o seu tamanho, a sua forma, a posição entre outros, e pode revelar estruturas como anéis, jatos e a atmosfera. Essas medidas podem ser feitas do solo, algo como Bruno Morgado do Observatório Nacional e seus colegas fez, usando a ocultação para explorar o satélite Europa de Júpiter.
“Nós usamos dados do primeiro lançamento de dados da missão Gaia, que do nosso ponto de vista na América do Sul, Europa passaria na frente de uma estrela brilhante de fundo em Março de 2017, e com isso foi possível prever o melhor local para poder observar a ocultação”, disse Bruno, principal autor de um artigo que relata as descobertas feitas na ocultação de 2017. A primeira liberação de dados da missão Gaia, aconteceu em Setembro de 2016.
“Isso nos deu uma excelente oportunidade para explorarmos Europa, já que a técnica oferece uma precisão comparável às imagens obtidas por sondas espaciais”.
Os dados da missão Gaia mostraram que o evento seria visível em uma faixa que cruzaria de noroeste para sudeste através da América do Sul. Três observatórios localizados no Brasil e no Chile foram capazes de adquirir os dados, um total de oito lugares tentaram, mas os outros apresentaram condições climáticas desfavoráveis.
Realizando as medidas foi possível refinar o raio do satélite Europa, para 1561.2 km, precisamente determinada a posição de Europa no espaço e em relação a Júpiter, e foi possível caracterizar a forma do satélite. Europa não é satélite perfeitamente esférico é um elipsoide. As observações mostraram que o satélite mede 1562 km quando a medida é feita em uma direção, o chamado semi-eixo maior, e mede 1560.4 km quando a medida é feita na outra direção, no chamado semi-eixo menor.
“É provável que nós tenhamos condições de observar mais ocultações como essa pelos satélites de Júpiter em 2019 e 2020”, comentou Bruno. “Júpiter está passando atualmente através de uma faixa do céu conhecida como centro galáctico, fazendo com que seus satélites passem na frente de muitas estrelas brilhantes no céu. Isso realmente ajuda os pesquisadores a medir com precisão a forma tridimensional do objeto e a suas posições, não somente para os 4 grandes satélites de Júpiter, mas também para os satélites menores e irregulares também”.
Usando o segundo conjunto de dados fornecidos pela missão Gaia em Abril de 2018, os cientistas já fizeram as previsões das datas das futuras ocultações de estrelas brilhantes por Europa, Io, Ganimedes e Calisto, nos anos seguintes. E teremos um total de 10 eventos, entre 2019 e 2021. Europa irá ocultar uma estrela em 22 de Junho de 2020, Calisto em 20 de Junho de 2020 e 4 de Maio de 2021, Io em 9 e 21 de Setembro de 2019 e em 2 de Abril de 2021, e Ganimedes em 25 de Abril de 2021.
Três ocultações já ocorreram em 2019, duas das quais, uma de Europa em 4 de Junho e uma de Calisto em 5 de Junho já foram observadas pelos pesquisadores e os dados estão ainda sendo analisados.
As próximas ocultações serão observáveis até mesmo por astrônomos amadores com telescópios de cerca de 20 cm, de vários locais do mundo. A posição favorável de Júpiter no plano galáctico só irá se repetir novamente em 2031.
“Os estudos de ocultações planetárias permitem que possamos aprender sobre os satélites do nosso Sistema Solar, mesmo estando longe, e são também relevantes para futuras missões que irão visitar esses mundos”, disse Timo Prusti, cientistas de projeto da Gaia na ESA. “Como esse resultado mostra, a Gia é uma missão muito versátil, ela não somente faz com que avançamos o nosso conhecimento sobre as estrelas, mas também do Sistema Solar”.
Um conhecimento preciso da órbita de Europa, por exemplo, irá ajudar na preparação de missões espaciais para o sistema Joviano, como a Jupiter Icy Moons Explorer, ou JUICE, da ESA também e a Europa Clipper da NASA, ambas programadas para serem lançadas na próxima década.
“Essas observações são muito interessantes”, disse Olivier Witasse, cientista de projeto da missão JUICE da ESA. “A JUICE irá chegar em Júpiter em 2029, se tivermos o melhor conhecimento possível das posições dos satélites do sistema, isso nos ajudará a preparar para a navegação da missão e para a análise de dados que teremos que fazer, além disso irá ajudar a planejar todos os dados científicos que pretendemos adquirir”.
“Essa ciência depende de nós sabermos coisas precisas como a trajetória dos satélites e entender o quão perto uma sonda pode chegar de um determinado corpo, assim sendo, quanto melhor sabemos sobre os satélites, podemos planejar melhor a missão e consequentemente melhorar a análise dos dados”.
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