Astrônomos utilizaram três telescópios nos observatórios do ESO, no Chile, para observar o planeta anão Makemake, no momento em que este passou em frente a uma estrela distante, bloqueando assim a radiação emitida pela estrela. As novas observações permitiram verificar pela primeira vez se o planeta se encontra rodeado por uma atmosfera. Este mundo frígido tem uma órbita que o leva ao Sistema Solar exterior e pensava-se que teria uma atmosfera como a de Plutão (eso0908). No entanto, verificou-se agora que não é o caso. Os cientistas mediram também pela primeira vez a densidade de Makemake. Os novos resultados serão publicados na revista Nature em 22 de novembro de 2012.
O planeta anão Makemake [1] tem cerca de dois terços do tamanho de Plutão e viaja em torno do Sol numa órbita distante, que se situa além de Plutão, mas mais próximo do Sol do que Éris, o planeta anão de maior massa conhecido no Sistema Solar (eso1142). Observações anteriores do gélido Makemake mostraram que este corpo é similar aos outros planetas anões, o que levou os astrônomos a pensarem que ele possuiria uma atmosfera semelhante à de Plutão. No entanto, este novo estudo mostra que, tal como Éris, Makemake não se encontra rodeado por uma atmosfera significativa.
A equipe liderada por José Luis Ortiz (Instituto de Astrofísica de Andalucía, CSIC, Espanha), combinou várias observações obtidas por três telescópios situados nos observatórios de La Silla e Paranal do ESO, no Chile – o Very Large Telescope (VLT), o New Technology Telescope (NTT) e o TRAPPIST (sigla do inglês para TRAnsiting Planets and PlanetesImals Small Telescope) – com dados de outros telescópios menores situados na América do Sul [2], para olhar para Makemake à medida que este passava em frente a uma estrela distante [3].
“Quando Makemake passou em frente da estrela, a radiação emitida por esta foi bloqueada, a estrela desapareceu e apareceu muito abruptamente, em vez de desaparecer lentamente e depois ficar gradualmente mais brilhante. Isto significa que o pequeno planeta anão não tem uma atmosfera significativa,” diz José Luis Ortiz. “Pensava-se que Makemake tivesse desenvolvido uma atmosfera – o fato de não haver sinais de uma, mostra apenas o quanto temos ainda a aprender sobre estes corpos misteriosos. Descobrir as propriedades de Makemake pela primeira vez é um grande passo em frente no estudo deste grupo seleto de planetas anões gélidos.”
A ausência de luas do Makemake e a grande distância a que se encontra de nós, tornam-no difícil de estudar [4], por isso o pouco que sabemos dele é apenas aproximado. As novas observações da equipe acrescentam muito mais detalhes ao nosso conhecimento deste objeto – determinando o seu tamanho de forma mais precisa, impondo limites a uma possível atmosfera e estimando a densidade do planeta anão pela primeira vez. Os dados também permitiram medir qual a quantidade de luz solar que é refletida pela superfície do planeta – o seu albedo [5]. O albedo de Makemake é cerca de 0,77, comparável ao da neve suja, maior que o de Plutão, mas menor que o do Éris.
Conseguiu-se observar Makemake com tanto detalhes, apenas porque este passou em frente de uma estrela – um fenômeno conhecido como uma ocultação estelar. Estas oportunidades raras permitem aos astrônomos descobrir muitas coisas sobre as atmosferas, muitas vezes tênues e delicadas, que se encontram em torno destes distantes mas importantes membros do Sistema Solar e fornecem informações precisas sobre as suas outras propriedades.
As ocultações são particularmente incomuns no caso de Makemake, já que este é um objeto que se move numa região do céu com relativamente poucas estrelas. Predizer de forma precisa e detectar estes eventos raros é extremamente difícil, e a observação bem sucedida levada a cabo por uma equipe de observação bem coordenada, espalhada por diversos locais em toda a América do Sul, é uma façanha extraordinária.
“Plutão, Éris e Makemake estão entre os maiores exemplos dos inúmeros corpos gélidos que orbitam muito longe do Sol,” diz José Luis Ortiz. “As nossas novas observações fizeram avançar muito o conhecimento sobre um dos maiores, Makemake. Poderemos agora usar esta informação para explorar mais a fundo os intrigantes objetos que se situam nesta região do espaço.”
Notas
[1] Makemake foi inicialmente conhecido por 2005FY9. Descoberto alguns dias depois da Páscoa, em Março de 2005, o objeto adquiriu o nome informal de Coelhinho da Páscoa. Em Julho de 2008 foi-lhe dado o nome oficial de Makemake. Makemake é o criador da humanidade e deus da fertilidade, nos mitos dos povos nativos da Ilha da Páscoa.
Makemake é um dos cinco planetas anões reconhecidos, até agora, pela União Astronômica Internacional. Os outros são Ceres, Plutão, Haumea e Éris. Mais informação sobre planetas anões e planetas encontra-se disponível nas páginas da União Astronômica Internacional.
[2] Outro telescópio utilizado nesta campanha de observações foi o telescópio de 0,84 metros, instalado pela Católica del Norte, Universidade do Chile. Este telescópio encontra-se no Cerro Armazones, futuro local do European Extremely Large Telescope (E-ELT).
[3] Makemake passou em frente da estrela de fraca luminosidade NOMAD 1181-0235723 (NOMAD refere-se a Naval Observatory Merged Astronomic Dataset) no dia 23 de abril de 2011. A equipe observou este evento com o auxílio de sete telescópios diferentes, espalhados pelo Brasil e pelo Chile. O fenômeno durou apenas um minuto, por isso os astrônomos tiveram que utilizar uma câmera especializada de alta velocidade, conhecida como ULTRACAM (eso0520) e uma câmera infravermelha de alta-velocidade, chamada ISAAC, para capturar o evento.
[4] No caso de objetos que têm em órbita um ou mais satélites, os movimentos destas luas podem ser utilizados para deduzir a massa do objeto. Isto não foi possível para o caso de Makemake.
[5] Calculou-se que o planeta anão tem um albedo geométrico de 0,77 ± 0.03, maior que o de Plutão, mas menor que o de Éris. Um albedo de 1 representa um corpo que reflete perfeitamente, e um albedo de 0 representa uma superfície negra, que não reflete nada. As observações, juntamente com resultados anteriores, indicam que Makemake tem uma densidade de 1,7 ± 0,3 gramas por centímetro cúbico o que, por sua vez, permitiu à equipe inferir a forma e a aparência de um esferóide oblato – uma esfera ligeiramente achatada em ambos os pólos – com eixos de 1430 ± 9 quilômetros e 1502 ± 45 quilômetros. Makemake não apresenta uma atmosfera global do tipo da de Plutão, ao nível de uma milésimo da atmosfera de Plutão. No entanto, pode ter um atmosfera que cubra só parte da superfície. Uma tal atmosfera local, que é possível segundo os modelos teóricos, não foi excluída por estas observações.
Mais Informações
Este trabalho foi apresentado no artigo científico “Albedo and atmospheric constraints of dwarf planet Makemake from a stellar occultation” que será publicado na revista Nature em 22 de novembro de 2012.
A equipe é composta por J. L. Ortiz (Instituto de Astrofísica de Andalucía, CSIC, Espanha), B. Sicardy (Observatoire de Paris; CNRS; Université Pierre et Marie Curie; Institut Universitaire de France), F. Braga-Ribas (Observatoire de Paris, CNRS, França; Observatório Nacional/MCTI, Brasil), A. Alvarez-Candal (European Southern Observatory, Chile; Instituto de Astrofísica de Andalucía, CSIC, Espanha), E. Lellouch (Observatoire de Paris, CNRS, França), et al.
Para uma lista completa dos autores e respectivas afiliações, ver o artigo na Nature.
O ano de 2012 marca o quinquagésimo aniversário da fundação do Observatório Europeu do Sul (ESO). O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a pesquisa em astronomia e é o observatório astronômico mais produtivo do mundo. O ESO é financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronômicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrônomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação nas pesquisas astronômicas. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera o Very Large Telescope, o observatório astronômico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio ALMA, o maior projeto astronômico que existe atualmente. O ESO está planejando o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 39 metros que observará na banda do visível e infravermelho próximo. O E-ELT será “o maior olho no céu do mundo”.
Fonte:
http://www.eso.org/public/brazil/news/eso1246/