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Nova Luz No Lado Escuro da Lua

The Dark Side of the Moon, é o título de um álbum memorável da grupo de rock Pink Floyd que o lançou em 1973. Mas o termo é um pouco impróprio e vamos entender porque. A Lua tem um movimento de rotação semelhante ao da Terra, mas ele é tão lento que mantém sempre o mesmo lado da Lua voltado para a Terra em fenômeno conhecido como rotação sincronizada. Quando a fase da Lua é nova o lado escuro da Lua está completamente iluminado, assim, no rigor da ciência não existe lado escuro. Lógico, ele é escuro para nós que não podemos observá-lo, ou melhor não podíamos até agora.

É difícil de acreditar mas até a poucas décadas atrás nós não tínhamos nenhuma pista sobre como poderia ser esse lado oculto da Lua. Porém com o início da corrida espacial no final dos anos 50, a então União Soviética enviou uma sonda para a Lua, a Luna 3 que fez então as primeiras imagens dessa paisagem lunar até então desconhecida para nós aqui na Terra.

Para a surpresa de todos as fotos, mesmo borradas, mostravam poucos mares – regiões circulares preenchida por lava congelada – no lado escuro da Lua, uma paisagem diferente do lado que observamos sempre. De fato só existiam duas regiões que poderiam ser chamadas de mar, o Mare Moscovrae (Mar de Moscou) e o Mare Desiderii (Mar dos Desejos). A Lua então tinha duas caras.

Um pouco mais de 50 anos depois dessa primeira imagem borrada do lado escuro, nós temos, graças ao avanço tecnológico, todo esse lado da Lua toppograficamente mapeado, com um extraordinário grau de precisão, trabalho esse feito pela sonda Lunar Reconnaissance Orbiter, que chegou na Lua no verão de 2009.

Levou um pouco mais de um ano para que o Lunar Orbiter Laser Altimeter, ou LOLA, instrumento acoplado à LRO construísse o mapa de elevação e toda a Lua. O altímetro pode registrar feições lunares com uma altura menor cinco polegadas. O instrumento envia pulsos de laser para a superfície lunar e mede o tempo que esse pulso gasta para refletir e retornar até a sonda.

O mapa altimétrico da Lua em cores falsas, revela de uma nova maneira como é a superfície pesadamente castigada por impactos do único satélite natural da Terra. O que chama a atenção no mapa do lado escuro (onde a cor azul representa as terras baixas e as cores amarelo e vermelho as terras altas) é a imensa escavação no polo sul lunar.

Pistas para a existência de uma bacia gigante no lado escuro da Lua remonta a 1962,  como era possível ver nas imagens transmitidas pelas sondas Luna 3 e Zond 3, ambas soviéticas. Pelo que os pesquisadores deduziram na época, esse teria sido um impacto de ângulo raso com a Lua e parte restante desse impacto que formou a gigantesca cratera do polo sul lunar estaria no planeta anão Vesta.

Mapas lunares anteriores que foram feitos através de décadas tinham diferentes resoluções, ângulos de visão, condições de iluminação tudo que dificultava gerar a partir dessas informações uma mapa topográfico que fosse consistente para toda a superfície da Lua. O mapa feito pelo altímetro da sonda LRO fornece aos pesquisadores um modelo sólido global da superfície da Lua.

O registro de crateras na Lua fornece pistas sobre impactos similares que atingiram a Terra no começo de sua vida. A história dos bombardeamentos de asteróides sofridos pela Terra foi em grande parte erodida e coberta devido a ação durante bilhões de anos de modificações e de atividades geológicas das mais diversas.

Os dados da sonda LRO confirmam as primeiras teorias de ocorreu uma última onda de colisões interplanetárias há 3.8 bilhões de anos. Nessa época uma das maiores feições presentes na Lua, o Mare Orientale foi formado, pois teve toda a sua cobertura arrancada pelos impactos.

Uma hipótese é que há 3.8 bilhões de anos, os planetas gigantes externos estavam desviando de suas órbitas. Isso perturbou o cinturão de asteróides, da mesma maneira que você pode perturbar uma árvore chacoalhando-a para fazer com que os frutos caiam, assim uma tempestade de asteróides invadiu os planetas internos. Nessa época na Terra deve ter se formado algumas dezenas de bacias, a maioria com aproximadamente 2 km de diâmetro e poucas que seriam grandes de dimensões continentais. Mas dos corpos celestes internos somente a Lua e Mercúrio que guardaram o  registro e as evidências desse último evento de bombardeamento em massa.

Os mapas digitais de elevação e de terreno feitos pela LRO guiarão futuras missões científicas, e eventualmente futuras expedições humanas à Lua. Em contraste com a época  de exploração lunar feita pela missão Apollo, nessa época os astronautas desbravaram a Lua usando mapas baseados em fotos feitas pelas sondas Lunar Orbiter e aplicando as leis da gravidade de Newton.

A sonda LRO continua mapeando com tanto detalhe a Lua, que futuras missões poderiam ter a disposição um sistema de GPS de precisão, especialmente se o objetivo for pousar uma nave nas regiões polares.

É possível com a tecnologia atual fazer um exercício de imaginação e pensar em algo como uma cena de cinema onde os astronautas digitam as coordenas no computador da nave e ela automaticamente pousa tranquilamente no solo lunar, enquanto isso a cabine toda equipada com a mais moderna tecnologia 3D oferece aos astronautas uma visão realista do que se passa nas imediações onde a nave acabou de pousar.

Pode-se pensar que eventualmente teremos no futuro habitações na Lua semelhantes às bases usadas na Antártica, por exemplo, de forma permanente, quem sabe na cratera sombreada Shackleton, muitos pensam que isso é só uma questão de qual país começará a construção. Desse local privilegiado, por exemplo, os astrônomos poderiam instalar rádio telescópios gigantes que não sofreriam de interferências da Terra e poderiam captar os sinais vitais para o entendimento do universo de forma mais clara e precisa.

Fonte:

http://news.discovery.com/space/laser-sheds-light-on-dark-side-of-moon.html

 

 

 

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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