fbpx

Medindo o Universo com mais precisão do que nunca

Artist’s impression of eclipsing binary

observatory_150105Ao fim de quase uma década de observações cuidadas, uma equipa internacional de astrônomos mediu a distância à nossa galáxia vizinha, a Grande Nuvem de Magalhães, com mais precisão do que nunca. Estas novas medições ajudam-nos a determinar melhor a taxa de expansão do Universo – a constante de Hubble – e são um passo crucial do sentido de compreendermos a misteriosa energia escura, que faz acelerar a expansão. A equipa observou com telescópios do Observatório de La Silla do ESO, no Chile, assim como com outros telescópios do mundo inteiro. Os resultados serão publicados na revista Nature a 7 de março de 2013.

Os astrónomos determinam a escala do Universo medindo primeiro a distância a objetos próximos e usando depois essas distâncias como velas padrão [1] para estimar distâncias cada vez maiores. No entanto, esta cadeia é apenas tão precisa quanto o seu elo mais fraco. Até agora, a medição precisa da distância à Grande Nuvem de Magalhães, uma das galáxias mais próximas da Via Láctea, provou ser algo complicado. Uma vez que as estrelas nesta galáxia são usadas para fixar a escala de distâncias a galáxias mais remotas, esta medição é muitíssimo importante.

Agora, observações cuidadas de uma classe rara de estrelas duplas permitiu a uma equipa de astrônomos deduzir um valor muito mais preciso da distância à Grande Nuvem de Magalhães : 163 000 anos-luz.

“Estou muito entusiasmado com este resultado porque há mais de cem anos que os astrônomos tentam medir com precisão a distância à Grande Nuvem de Magalhães, o que tem provado ser extremamente difícil,” diz Wolfgang Gieren (Universidad de Concepción, Chile) e um dos líderes da equipa. “Nós resolvemos este problema ao obter um resultado com uma precisão demonstrada de 2%.”

A melhoria na medição da distância à Grande Nuvem de Magalhães dá também distâncias mais precisas a muitas estrelas variáveis do tipo Cefeide [2]. Estas estrelas brilhantes que pulsam, são usadas como velas padrão para medir distâncias às galáxias mais remotas e determinar a taxa de expansão do Universo – a constante de Hubble, o que, por sua vez, é a base para observar o Universo até às galáxias mais longínquas que podem ser hoje vistas com os telescópios atuais. Portanto, a maior precisão na distância à Grande Nuvem de Magalhães leva a uma redução imediata da imprecisão nas medições atuais de distâncias cosmológicas.

Explanation of eclipsing binaries

Os astrônomos conseguiram tornar mais precisa a distância à Grande Nuvem de Magalhães ao observar pares raros de estrelas, chamadas binários de eclipse [3]. À medida que estas estrelas orbitam em torno uma da outra, vão passando também à frente uma da outra. Quando isto acontece, visto da Terra, o brilho total do binário diminui de determinado valor quando uma estrela passa em frente da outra e diminui de outro valor quando essa estrela passa por detrás [4].

Ao detectarmos cuidadosamente estas variações no brilho e ao medir igualmente a velocidade orbital das estrelas, é possível determinar o tamanho das estrelas, as suas massas e as características das suas órbitas. Combinando estes dados com medições cuidadosas do brilho total e da cor das estrelas [5], podem ser determinadas distâncias muito precisas.

Este método já foi utilizado anteriormente, mas apenas com estrelas quentes. No entanto, para esses casos têm que ser supostas determinadas condições e por isso as distâncias que daí se derivam não são tão precisas como desejaríamos. Agora, pela primeira vez, conseguiu-se identificar oito binários de eclipse muito raros, onde ambas as estrelas são gigantes vermelhas mais frias [6]. Estas estrelas foram estudadas com todo o detalhe, o que originou valores para a distância muitíssimo precisos – até 2%.

“O ESO forneceu-nos o conjunto perfeito de telescópios e instrumentos necessários a este projeto: o HARPS, que mede velocidades radiais extremamente precisas de estrelas relativamente ténues e o SOFI, que faz medições precisas do brilho das estrelas no infravermelho,” acrescenta Grzegorz Pietrzy?ski (Universidad de Concepción, Chile e Observatório da Universidade de Varsóvia, Polónia), autor principal do novo artigo científico na Nature.

“Estamos a trabalhar no sentido de melhorar ainda mais o nosso método e esperamos conseguir obter nos próximos anos uma distância à Grande Nuvem de Magalhães com um 1% de precisão. Este trabalho tem consequências tremendas, não apenas no campo da cosmologia, mas também em muitas outras áreas da astrofísica,” conclui Dariusz Graczyk, o segundo autor do novo artigo na Nature.

Map of the Large Magellanic Cloud

Notas

[1] As velas padrão são objetos para os quais se conhece o seu brilho absoluto. Ao observar quão brilhante um objeto nos parece – o brilho aparente – os astrônomos podem determinar a distância a que se encontram – objetos mais distantes parecem menos brilhantes. Exemplos de tais velas padrão são as variáveis do tipo Cefeide [2] e as supernovas do tipo Ia. A grande dificuldade é calibrar a escala de distâncias, recorrendo a observações de tais objetos relativamente próximos de nós, e para os quais a distância pode ser calculada por outros métodos.

[2] As variáveis do tipo Cefeide são estrelas instáveis brilhantes, que pulsam e variam em brilho. Existe uma relação muito clara entre a velocidade desta variação e o seu brilho. As Cefeides que pulsam mais rapidamente são mais ténues do que as que pulsam mais devagar. A relação período-luminosidade permite-nos usar estas estrelas como velas padrão para medir as distâncias às galáxias próximas.

[3] Este trabalho faz parte de um projeto a longo termo chamado Projeto Araucaria, que pretende melhorar as medições das distâncias às galáxias próximas.

[4] As variações de brilho dependem dos tamanhos relativos das estrelas, das suas temperaturas e cores e das características das órbitas.

[5] As cores são medidas ao comparar o brilho das estrelas a diferentes comprimentos de onda no infravermelho.

[6] Estas estrelas foram encontradas entre 35 milhões de estrelas observadas na Grande Nuvem de Magalhães pelo projeto OGLE.

Mais Informações

Este trabalho foi descrito num artigo científico “An eclipsing binary distance to the Large Magellanic Cloud accurate to 2 per cent”, por G. Pietrzy?ski et al., que será publicado a 7 de março de 2013 na revista Nature.

A equipa é composta por G. Pietrzy?ski (Universidad de Concepción, Chile; Observatório da Universidade de Varsóvia, Polónia), D. Graczyk (Universidad de Concepción), W. Gieren (Universidad de Concepción), I. B. Thompson (Carnegie Observatories, Pasadena, EUA), B., Pilecki (Universidad de Concepción; Observatório da Universidade de Varsóvia), A. Udalski (Observatório da Universidade de Varsóvia), I. Soszy?ski (Warsaw University Observatory), S. Koz?owski (Observatório da Universidade de Varsóvia), P. Konorski (Observatório da Universidade de Varsóvia), K. Suchomska (Observatório da Universidade de Varsóvia), G. Bono (Università di Roma Tor Vergata, Roma, Itália; INAF-Osservatorio Astronomico di Roma, Itália), P. G. Prada Moroni (Università di Pisa, Itália; INFN, Pisa, Itália), S. Villanova (Universidad de Concepción ), N. Nardetto (Laboratoire Fizeau, UNS/OCA/CNRS, Nice, França),  F. Bresolin (Institute for Astronomy, Hawaii, EUA), R. P. Kudritzki (Institute for Astronomy, Hawaii, EUA), J. Storm (Instituto Leibniz para a Astrofísica, Potsdam, Alemanha), A. Gallenne (Universidad de Concepción), R. Smolec (Centro Astronómico Nicolaus Copernicus, Varsóvia, Polónia), D. Minniti (Pontificia Universidad Católica de Chile, Santiago, Chile; Observatório do Vaticano, Itália), M. Kubiak (Observatório da Universidade de Varsóvia), M. Szyma?ski (Observatório da Universidade de Varsóvia), R. Poleski (Observatório da Universidade de Varsóvia), ?. Wyrzykowski (Observatório da Universidade de Varsóvia), K. Ulaczyk (Observatório da Universidade de Varsóvia), P. Pietrukowicz (Observatório da Universidade de Varsóvia), M. Górski (Observatório da Universidade de Varsóvia), P. Karczmarek (Observatório da Universidade de Varsóvia).

O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio  ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 39 metros que observará na banda do visível e próximo infravermelho. O E-ELT será “o maior olho no céu do mundo”.

Fonte:

http://www.eso.org/public/brazil/news/eso1311/

alma_modificado_rodape105

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

Veja todos os posts

Arquivo