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Imagem Única De Um Buraco Negro e o Seu Jato de Partículas

Pela primeira vez, astrônomos observaram, na mesma imagem, a sombra do buraco negro no centro da galáxia Messier 87 (M87) e o poderoso jato expelido por ele. As observações foram feitas em 2018 com telescópios do Global Millimetre VLBI Array (GMVA), do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), do qual o ESO é parceiro, e do Greenland Telescope (GLT). Graças a essa nova imagem, os astrônomos podem entender melhor como os buracos negros lançam jatos tão energéticos.

A maioria das galáxias abriga um buraco negro supermassivo em seu centro. Enquanto os buracos negros são conhecidos por engolir matéria em sua vizinhança imediata, eles também podem lançar poderosos jatos de matéria que se estendem além das galáxias em que vivem. Compreender como os buracos negros criam esses enormes jatos tem sido um problema de longa data na astronomia. “Sabemos que os jatos são ejetados da região ao redor dos buracos negros”, diz Ru-Sen Lu, do Observatório Astronômico de Xangai na China, “mas ainda não entendemos completamente como isso acontece. Para estudar isso diretamente, precisamos observar a origem do jato o mais próximo possível do buraco negro.”

A nova imagem publicada hoje mostra exatamente isso pela primeira vez: como a base de um jato se conecta com a matéria girando em torno de um buraco negro supermassivo. O alvo é a galáxia M87, localizada a 55 milhões de anos-luz de distância em nossa vizinhança cósmica e lar de um buraco negro 6,5 bilhões de vezes mais massivo que o Sol. Observações anteriores conseguiram imaginar separadamente a região próxima ao buraco negro e o jato, mas esta é a primeira vez que ambos os recursos são observados juntos. “Esta nova imagem completa o quadro ao mostrar a região ao redor do buraco negro e o jato ao mesmo tempo”, acrescenta Jae-Young Kim da Kyungpook National University na Coreia do Sul e do Max Planck Institute for Radio Astronomy na Alemanha.

A imagem foi obtida com o GMVA, ALMA e o GLT, formando uma rede de radiotelescópios em todo o mundo que trabalham juntos como um telescópio virtual do tamanho da Terra. Uma rede tão grande pode discernir detalhes muito pequenos na região ao redor do buraco negro da M87.

A nova imagem mostra o jato emergindo perto do buraco negro, bem como o que os cientistas chamam de sombra do buraco negro. À medida que a matéria orbita o buraco negro, ela se aquece e emite luz. O buraco negro dobra e captura parte dessa luz, criando uma estrutura semelhante a um anel ao redor do buraco negro, conforme visto da Terra. A escuridão no centro do anel é a sombra do buraco negro, que foi imageado pela primeira vez pelo Event Horizon Telescope (EHT) em 2017. Tanto esta nova imagem quanto a do EHT combinam dados obtidos com vários radiotelescópios em todo o mundo, mas a imagem lançada hoje mostra a luz rádio emitida em um comprimento de onda mais longo do que a do EHT: 3,5 mm em vez de 1,3 mm. “Neste comprimento de onda, podemos ver como o jato emerge do anel de emissão ao redor do buraco negro supermassivo central”, diz Thomas Krichbaum, do Max Planck Institute for Radio Astronomy.

O tamanho do anel observado pela rede GMVA é aproximadamente 50% maior em comparação com a imagem do Event Horizon Telescope. “Para entender a origem física do anel maior e mais espesso, tivemos que usar simulações de computador para testar diferentes cenários”, explica Keiichi Asada, da Academia Sinica em Taiwan. Os resultados sugerem que a nova imagem revela mais material que está caindo em direção ao buraco negro do que o que pôde ser observado com o EHT.

Essas novas observações do buraco negro da M87 foram conduzidas em 2018 com o GMVA, que consiste em 14 radiotelescópios na Europa e América do Norte. Além disso, outras duas instalações foram vinculadas ao GMVA: o Greenland Telescope e o ALMA, do qual o ESO é parceiro. O ALMA é composto por 66 antenas no deserto do Atacama, no Chile, e desempenhou um papel fundamental nessas observações. Os dados coletados por todos esses telescópios em todo o mundo são combinados usando uma técnica chamada interferometria, que sincroniza os sinais captados por cada instalação individual. No entanto, para capturar adequadamente a forma real de um objeto astronômico, é importante que os telescópios estejam espalhados por toda a Terra. Os telescópios GMVA estão principalmente alinhados de leste a oeste, então a adição do ALMA no hemisfério sul provou ser essencial para capturar esta imagem do jato e da sombra do buraco negro da M87. “Graças à localização e sensibilidade do ALMA, pudemos revelar a sombra do buraco negro e ver mais profundamente a emissão do jato ao mesmo tempo”, explica Lu.

Futuras observações com esta rede de telescópios continuarão a desvendar como os buracos negros supermassivos podem lançar jatos poderosos. “Planejamos observar a região ao redor do buraco negro no centro da M87 em diferentes comprimentos de onda de rádio para estudar ainda mais a emissão do jato”, diz Eduardo Ros, do Max Planck Institute for Radio Astronomy. Tais observações simultâneas permitiriam à equipe desvendar os complicados processos que ocorrem perto do buraco negro supermassivo. “Os próximos anos serão emocionantes, pois poderemos aprender mais sobre o que acontece perto de uma das regiões mais misteriosas do Universo”, conclui Ros.

Fonte:

https://www.eso.org/public/news/eso2305/?lang

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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