Imagine a sua constelação favorita no céu sem uma de suas estrelas mais brilhantes. Por alguns segundos na noite entre 11 e 12 de dezembro de 2023 é isso que irá acontecer na constelação de Orion, pelo menos para os observadores que estiverem localizados numa estreita faixa da Ásia central e do sul da Europa até a Flórida e o México. Por volta da 01:17 UTC do dia 12 de dezembro de 2023, o asteroide 319 Leona que fica no Cinturão Principal de Asteroides do Sistema Solar irá passar na frente da estrela Betelgeuse, a estrela vermelha alaranjada que fica no ombro de Orion. Nesse momento o asteroide irá eclipsar a estrela, ou parte dela e por alguns segundos seu brilho será bloqueado.
A ocultação de uma estrela de primeira magnitude é algo raro de acontecer, um evento como esse ocorre poucas vezes numa década. Mas esse tipo de evento é muito importante para os astrônomos, e pode fornecer muitas informações científicas. Medindo de forma precisa o tempo de duração da ocultação de vários locais e de maneira simultânea, é possível refinar medidas sobre o tamanho e sobre a forma do asteroide. E dessa vez os astrônomos poderão também mapear as gigantescas e estranhas células convectivas de Betelgeuse, essas células convectivas são as responsáveis por aumentar e diminuir o brilho da estrela por meses, como já vimos a alguns anos atrás. Betelgeuse é a décima estrela mais brilhante do céu com uma magnitude de +0.5, então não é necessário nenhum grande instrumento para acompanhar o evento.
Mesmo estando a 550 anos-luz de distância da Terra, Betelgeuse é uma das estrelas mais brilhantes do céu pois ela é uma supergigante vermelha. Em diâmetro Betelgeuse é cerca de 760 vezes maior que o Sol, e o seu disco tem cerca de 50 miliarcos de segundo no céu, um diâmetro aparente muito maior do que a maior parte das estrelas. Porém, diferente da maior parte dos eventos de ocultação, o começo da ocultação de Betelgeuse não será instantâneo.
À medida que o asteroide move na frente da face da estrela ele irá cobrir as grandes células de convecção de Betelgeuse, células essas que são muito mais brilhantes do que o resto da superfície da estrela. Então, medindo o brilho da estrela durante a ocultação será possível mapear essas células convectivas. Será possível obter informação sobre a distribuição dessas células e ver se isso pode explicar a perda de massa observada de Betelgeuse com os grandes telescópios.
O que acontece em Betelgeuse é que diferente do Sol onde as células convectivas duram pouco tempo, minutos normalmente, em Betelgeuse, essas imensas células podem durar meses e até mesmo anos, contribuindo assim para as mudanças gerais do brilho da estrela, à medida que ela gira lentamente num período de 30 anos.
O resultado será interessante já que não existe nenhuma técnica disponível hoje que seja capaz de mostrar essas células convectivas. As observações da ocultação irão complementar os dados obtidos por interferômetros infravermelhos. Para poder registrar essas células convectivas estão sendo sugerido o uso de filtros R, G, B ou H-alfa, bem como a realização de espectrometria durante a ocultação para revelar as mudanças de velocidade entre as diferentes células.
Mas a ocultação de Betelgeuse não vai servir apenas para estudar a estrela e suas células de convecção, a ocultação também servirá para se estudar o asteroide Leona. A ocultação será o momento ideal para se estudar a forma do asteroide. Até recentemente somente o seu diâmetro era conhecido, cerca de 60 km, e a sua forma era assumida como sendo esférica, mas isso por falto de uma informação melhor.
Porém isso mudou recentemente, há 3 meses, em 13 de setembro de 2023, o Leona ocultou outro objeto, dessa vez uma estrela de magnitude 12. Os observadores em diferentes localizações conseguiram fazer 17 medidas precisas dos tempos de ocultação, e usando essas medidas os astrônomos puderam estimar a forma do asteroide, que não é nada esférico e está mais para uma elipse. Aí em 16 de setembro de 2023, o Leona passou na frente de outra estrela, mais apagada e foi possível estimar a rotação do objeto por meio da medida da sua curva de luz.
O modelo estabelece que o asteroide tem uma forma levemente elíptica e o seu tamanho está entre 55 e 80 km. O interessante dessas medidas é que podem ser usadas para prever qual será a silhueta do Leona na frente de Betelgeuse na ocultação de 12 de dezembro, além de prever como deve decorrer a ocultação. De acordo com os cálculos o Leona deve ocupar entre 41 e 46 mili arcos de segundo no céu.
Esse é um tamanho parecido com o de Betelgeuse, porém, como Betelgeuse é uma estrela e possui uma atmosfera ela deve aparecer maior do que o asteroide.
Betelgeuse aparecendo maior do que o asteroide, na parte central da ocultação vai lembrar muito um eclipse anular do Sol, já se o asteroide for maior que a estrela e a sua forma se confirmar poderemos ter algo parecido com um eclipse total.
Infelizmente no Brasil não poderemos acompanhar a ocultação, mas certamente teremos bons resultados para compartilhar depois desse evento impressionante.
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