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21 de novembro de 2024

Construindo Estradas na Lua Com a Poeira Lunar

A exploração lunar sempre foi um tema de grande interesse científico. Com o avanço das tecnologias e a ambição de estabelecer uma presença humana sustentada na Lua, os desafios enfrentados pelos astronautas tornam-se cada vez mais evidentes. Entre os obstáculos, a radiação potente, as variações extremas de temperatura e a gravidade desafiadora são apenas alguns dos elementos a serem considerados. No entanto, um dos problemas mais persistentes e menos discutidos é a poeira lunar.

Durante as missões Apollo, a poeira lunar provou ser um adversário formidável. Embora os astronautas da Apollo 11 não tenham afundado na poeira, como se temia inicialmente, a presença constante e aderente dessa poeira causou problemas. A Agência Espacial Europeia (ESA) reconhece que, para estabelecer uma presença humana prolongada na Lua, é essencial abordar a questão da poeira.

Uma solução proposta é transformar essa poeira em superfícies sólidas para condução e pouso. Em vez de desenvolver veículos que sejam resistentes à poeira, a ESA sugere uma abordagem mais direta: derreter a poeira onde ela se encontra, formando uma superfície de condução endurecida. Mas como isso seria realizado?

A NASA, em seus modelos, mostrou que o pouso de uma nave espacial pode deslocar toneladas de poeira fina, que, devido à baixa gravidade lunar, pode levar muito tempo para assentar. Isso não foi um grande problema para os pequenos módulos de pouso da Apollo, mas os futuros módulos serão significativamente maiores, tornando a questão da poeira ainda mais crítica.

A ESA, em sua iniciativa chamada PAVER (pavimentando o caminho para a sinterização de regolito em grandes áreas), explorou a ideia de usar lasers de alta energia para derreter a poeira lunar. Este programa, que é uma colaboração de várias empresas e organizações europeias, conduziu testes controlados em regolito lunar simulado usando um laser de CO2 de 12 quilowatts. Os resultados foram promissores, produzindo uma superfície lisa e vítreo.

Curiosamente, a ideia de derreter areia para criar superfícies de condução não é nova. Em 1933, foi proposto derreter areia terrestre para formar uma superfície de condução sólida, utilizando a energia solar concentrada através de lentes. Embora essa ideia nunca tenha sido implementada na Terra, ela pode encontrar sua aplicação na Lua, onde a exploração in-situ é crucial para o sucesso das missões.

Advenit Makaya, engenheiro de materiais da ESA, esclareceu que, na prática, não se traria um laser de dióxido de carbono para a Lua. Em vez disso, a solução proposta envolveria o uso de luz solar lunar, que poderia ser concentrada usando uma lente Fresnel para produzir um efeito de fusão semelhante. As lentes Fresnel, que são mais compactas e utilizam menos material do que as lentes tradicionais, foram originalmente desenvolvidas para uso em faróis no século XVIII.

Um estudo recente publicado em Nature Scientific Reports detalhou os resultados do programa PAVER. O artigo, intitulado “Laser melting manufacturing of large elements of lunar regolith simulant for paving on the Moon”, foi liderado por Juan-Carlos Ginés-Palomares, pesquisador assistente da Universidade Técnica de Berlim. O estudo concluiu que a energia solar e o regolito lunar, sendo diretamente disponíveis na Lua, tornam a sinterização direta ou fusão do regolito uma abordagem viável para a fabricação de objetos na superfície lunar.

Além disso, os pesquisadores analisaram suas amostras com um microscópio eletrônico de varredura, verificando a presença de rachaduras, bolhas e cristais. Também testaram a resistência à compressão das amostras, um aspecto crucial para qualquer superfície de estrada. Os resultados mostraram que as amostras tinham uma resistência à compressão variando de 216,29 a 56,19 MPa, com uma média de 93,97 MPa. Para efeito de comparação, o concreto tem uma resistência à compressão típica na faixa de 20-120 MPa.

Em resumo, a exploração lunar apresenta desafios únicos, e a poeira lunar é um dos obstáculos mais persistentes. No entanto, com a combinação de tecnologias modernas e ideias históricas, soluções inovadoras estão sendo desenvolvidas. A abordagem proposta pela ESA, de usar lasers ou luz solar concentrada para derreter e solidificar a poeira lunar, pode ser um passo significativo para estabelecer uma presença humana sustentada na Lua.

Fonte:

https://www.universetoday.com/163683/building-roads-out-of-moon-dust/

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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