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17 de novembro de 2024

Arqueologia Estelar: Astrônomos Investigam Estágio Bem Inicial da Fase de Formação das Estrelas

Dois artigos recentes propõem o modelo de um “primeiro núcleo” – objetos de vida curta que nascem das protoestrelas

Tudo que vive ou respira na Terra deve a sua existência ao Sol, o grande poder que vem do céus. Mas a que o Sol deve a sua existência?

O processo pelo qual o Sol e as suas estrelas companheiras se formam, transformando uma nuvem fria de gás e poeira para uma reação de fusão nuclear que queima por bilhões de anos é entendido de forma razoável, graças aos trabalhos teóricos cada vez mais refinados que são suportados por sofisticadas simulações de computador e detalhadas observações das regiões de formação de estrelas encontradas no céu.

Estrela Inicial: Estrelas recém nascidas brilham na constelação de Perseus. Os astrônomos estão buscando por objetos pré-estelares para investigar os estágios iniciais de formação das estrelas. Imagem NASA/JPL-Caltech/L. Cieza (Univ. of Texas at Austin)

Mas nem todos os estágios da formação de uma estrela podem ser observados diretamente. Em particular uma fase transitória, conhecida como o primeiro núcleo hidrostático ou simplesmente o primeiro núcleo, está longe de ser detectada, mesmo em modelos que estimam o desenvolvimento de estrelas de baixa massa como o Sol têm sugerido a sua existência mas sem a identificação direta. Mas nos meses recentes dois grupos têm identificado objetos que podem ser estrelas em processo de nascimento e que estão nessa fase, o primeiro núcleo, ambas estão localizadas a aproximadamente 800 anos-luz de distância da Terra na constelação de Perseus. Se for possível proceder com a confirmação isso irá preencher o vazio existente na história da formação de estrelas.

O primeiro núcleo de uma estrela de pouca massa (estrelas que possuem não mais do que algumas massas solares), que tem sido previsto existir pelos teóricos desde a década de 1960, se desenvolve quando uma espessa nuvem de gás e poeira começa a cair gravitacionalmente sobre si mesma, com isso calor é liberado à medida que o material é comprimido no seu centro. Quando a região central da nuvem se torna suficientemente densa e opaca o calor é aprisionado dentro da nuvem anteriormente colapsada produzindo dessa maneira um primeiro núcleo relativamente estável com temperatura de aproximadamente 100 Kelvin (-175 graus Celsius), e grande o suficiente em tamanho para engolir os planetas do sistema solar interno se ela fosse colocada no lugar do Sol. Mas, embora o colapso da nuvem reduza a sua velocidade com a formação do primeiro núcleo ele não pára completamente e a densidade e temperatura do núcleo continuam a aumentar com o tempo.

Quando atinge a temperatura aproximada de 2000 Kelvin (1700 graus Celsius) o gás predominante do núcleo, hidrogênio, quebra as suas moléculas em átomos individuais e o núcleo começa um colapso mais dramático. “Toda a energia que foi gasta em manter o calor serve para quebrar o hidrogênio molecular”, explica Melissa Enoch, pesquisadora de pós-doutorado em astronomia na University of California, Berkeley e co-autora de um estudo apresentado na edição de 10 de Outubro de 2010 do The Astrophysical Journal Letters, identificando um possível primeiro núcleo de uma futura estrela. “Assim, nessas condições não se tem mais a capacidade de se resistir ao colapso”. O que emerge do colapso é muito menor, mais denso e mais quente, o que chamamos de uma protoestrela.

O fato de um primeiro núcleo não ter sido observado de forma conclusiva pelos astrônomos em qualquer estrela não é surpresa: essa fase dura dezenas de milhares de anos, e tem um brilho muito apagado. “É um estágio que tem um período de vida muito curto, e essa é uma das razões pela qual não conseguimos observar, além disso a energia irradiada é muito tênue e no comprimento de onda do infravermelho”, disse Héctor Arce, um astrônomo da Yale University co-autor de outro trabalho publicado na edição de 1 de Junho de 2010 do The Astrophysical Journal descrevendo outro objeto que se ajusta aos parâmetros para ser uma estrela em formação na fase de seu primeiro núcleo. “Nós podemos observar núcleos que não são estelares, que ainda não possuem protoestrelas e podemos observar protoestrelas bem jovens, mas não conseguimos observar ainda a fase intermediária entre esses dois estágios”.

Ambos os grupos de pesquisadores procuraram por radiação de regiões onde não devia haver nenhuma – densas nuvens que anteriormente eram consideradas sem estrelas. Em observações profundas feitas com o Telescópio espacial Spitzer da NASA, o grupo de Enoch identificou emissão infravermelha de uma região conhecida como Per-Bolo 58no comprimento de onda do infravermelho longo de 70 micra (uma micra é igual a um milionésimo do metro) e muito pouca radiação em comprimentos de onda mais curtos, como seria esperado de um frio primeiro núcleo.

Arce e seus colegas usaram um conjunto de telescópios baseados em Terra e a técnica submilimétrica para localizar ejeções de gás molecular de uma área conhecida como L1448 IRS2E. Algumas simulações têm previsto que essas ejeções devem emanar de um primeiro núcleo à medida que o disco em rotação do material ao redor do núcleo interagem com o campo magnético do objeto. Os pesquisadores não detectaram o objeto candidato em 70 micra; eles tiveram acesso somente à pesquisa de banda larga do Spitzer de uma área e não de um tipo de observação profunda e em detalhe como foi feita da região Per-Bolo 58 conseguida pelo grupo de Enoch em 2008. O telescópio espacial esgotou o seu líquido que mantém os instrumentos em temperaturas congelantes em 2009, fazendo com que os detectores sejam inúteis para registrar comprimentos de onda do infravermelho. Mas em imagens de pesquisa da fonte não infravermelha foram detectados comprimentos de onda mais curtos, indicando que o candidato a primeiro núcleo é realmente mais frio do que as jovens protoestrelas próximas conhecidas, todas que aparecem nos dados do Spitzer.

Mas nenhum dos dois candidatos a primeiro núcleo possuem resultados conclusivos, e os astrônomos que preveram a existência do primeiro núcleo a mais de 40 anos atrás ainda não estão convencidos que a sua previsão foi comprovada. “É um pouco prematuro ainda garantir, pois não existem descobertas definitivas”, disse Richard Larson, um astrônomo de Yale cuja as simulações numéricas de formação de estrelas em 1969 previram a existência de um primeiro núcleo de vida curta. “Em ambos os casos as descobertas são sugestivas mas não conclusivas”.

O grupo de Arce que estudou o objeto L1448 IRS2E não foi detectado no infravermelho e Enoch e seus colegas que estudaram o objeto Per-Bolo 58 mostraram um sinal tênue de uma emissão relativamente quente que de acordo com os modelos mais simples de um primeiro núcleo frio não deveria estar ali. Enoch notou que a emissão poderia se originar de uma emissão que fez uma cavidade no material ao redor do núcleo, fazendo com que ele ficasse menos opaco e permitindo assim que mais radiação escapasse. “A outra possibilidade é que isso poderia ser uma protoestrela muito, mas muito apagada, então nós ainda precisamos fazer observações adicionais para tentar comprovar”, disse ela. O observatório baseado no espaço Herschel da Agência Espacial Européia, que foi lançado em 2009 e o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), agora em construção no Chile, podem ajudar a identificar e seguir os possíveis primeiros núcleos nos próximos anos.

Se os dois grupos identificaram um primeiro núcleo ou simplesmente protoestrelas extremamente apagadas e muito jovens, Larson nota, os astrônomos parecem ter identificado estrelas que estão em um ponto muito inicial em suas histórias de vida – talvez em um estágio que ainda não tenha sido identificado antes. “Em ambos os casos, eles estão observando um estágio bem inicial da formação de estrelas”, disse Larson. “Isso é interessante pois foi possível mostrar agora em detalhe o que acontece nesses estágios bem iniciais”.

Fonte:

http://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=first-hydrostatic-core

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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