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ALMA Descobre Uma Fábrica de Cometas

Esta concepção artística mostra a armadilha de poeira no sistema Oph-IRS 48. Esta armadilha de poeira dá às minúsculas rochas do disco um porto seguro onde se podem aglutinar e crescer até atingir o tamanho necessário para poderem sobreviver por si mesmas. Crédito: ESO/L. Calçada
Esta concepção artística mostra a armadilha de poeira no sistema Oph-IRS 48. Esta armadilha de poeira dá às minúsculas rochas do disco um porto seguro onde se podem aglutinar e crescer até atingir o tamanho necessário para poderem sobreviver por si mesmas.
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ESO/L. Calçada

observatory_150105Com o auxílio do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), astrônomos obtiveram uma imagem de uma região em torno de uma estrela jovem, onde partículas de poeira podem crescer juntando-se umas às outras. Esta é a primeira vez que uma armadilha de poeira deste tipo é claramente observada e modelada, resolvendo assim um mistério de longa data relativo ao modo como as partículas de poeira nos discos crescem até atingirem tamanhos suficientemente grandes, que as levem eventualmente a formarem cometas, planetas e outros corpos rochosos. Os resultados serão publicados em 7 de junho de 2013 na revista Science.

Os astrônomos sabem hoje em dia que existem inúmeros planetas em torno de outras estrelas, mas ainda não compreendem bem como é que estes corpos se formam, existindo igualmente muitos aspectos na formação de cometas, planetas e outros corpos rochosos que permanecem um mistério. Agora, novas observações que utilizam o potencial do ALMA, começam a responder a uma das maiores perguntas: como é que pequeníssimos grãos de poeira situados no disco em torno de uma estrela jovem crescem mais e mais, até atingirem o tamanho de cascalho ou mesmo pedregulhos com mais de um metro?

Esta imagem obtida pelo Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) mostra a armadilha de poeira situada no disco que circunda o sistema Oph-IRS 48. A elevada assimetria da emissão de poeira entre as regiões norte e sul do disco (de pelo menos um fator 130) é indicadora da presença de tal armadilha de poeira, a qual dá às minúsculas rochas do disco um porto seguro onde se podem aglutinar e crescer até atingir o tamanho necessário para poderem sobreviver por si mesmas. Crédito: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)/Nienke van der Marel
Esta imagem obtida pelo Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) mostra a armadilha de poeira situada no disco que circunda o sistema Oph-IRS 48. A elevada assimetria da emissão de poeira entre as regiões norte e sul do disco (de pelo menos um fator 130) é indicadora da presença de tal armadilha de poeira, a qual dá às minúsculas rochas do disco um porto seguro onde se podem aglutinar e crescer até atingir o tamanho necessário para poderem sobreviver por si mesmas.
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ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)/Nienke van der Marel

Os modelos de computador sugerem que os grãos de poeira crescem quando colidem uns com os outros, aglutinando-se. No entanto, quando estes grãos maiores chocam de novo a alta velocidade, ficam muitas vezes desfeitos em pedaços, voltando à casa de partida. Mesmo quando isso não acontece, os modelos mostram que os grãos maiores rapidamente se deslocam para o interior devido à fricção entre a poeira e o gás, caindo assim na estrela progenitora, o que não lhes deixa nenhuma hipótese de crescer mais.

Assim, os grãos de poeira precisam de um porto seguro onde as partículas possam continuar a crescer até atingirem um tamanho que lhes permita sobreviver por si mesmas [1]. Tais “armadilhas de poeira” foram já sugeridas, mas até agora não havia prova observacional da sua existência.

Esta imagem obtida pelo Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) mostra a armadilha de poeira situada no disco que circunda o sistema Oph-IRS 48. Esta armadilha de poeira dá às minúsculas rochas do disco um porto seguro onde se podem aglutinar e crescer até atingir o tamanho necessário para poderem sobreviver por si mesmas. A parte verde mostra onde é que as partículas maiores (com tamanhos da ordem de milímetros) se encontram localizadas e corresponde à armadilha de poeira descoberta pelo ALMA. O anel laranja mostra as observações das partículas muito menores (com tamanhos da ordem de mícrons), obtidas com o instrumento VISIR, montado no Very Large Telescope do ESO. Crédito: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)/Nienke van der Marel
Esta imagem obtida pelo Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) mostra a armadilha de poeira situada no disco que circunda o sistema Oph-IRS 48. Esta armadilha de poeira dá às minúsculas rochas do disco um porto seguro onde se podem aglutinar e crescer até atingir o tamanho necessário para poderem sobreviver por si mesmas.
A parte verde mostra onde é que as partículas maiores (com tamanhos da ordem de milímetros) se encontram localizadas e corresponde à armadilha de poeira descoberta pelo ALMA. O anel laranja mostra as observações das partículas muito menores (com tamanhos da ordem de mícrons), obtidas com o instrumento VISIR, montado no Very Large Telescope do ESO.
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ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)/Nienke van der Marel

Nienke van der Marel, estudante de doutoramento no Observatório de Leiden, Holanda, e autora principal do artigo científico que descreve os resultados, estava utilizando o ALMA em conjunto com os seus colaboradores para estudar o disco num sistema chamado Oph-IRS 48 [2]. A equipe descobriu que a estrela se encontrava rodeada por um anel de gás com um buraco central, criado muito provavelmente por um planeta invisível ou por uma estrela companheira. Observações anteriores obtidas com o Very Large Telescope do ESO tinham já mostrado que as pequenas partículas de poeira formavam também uma estrutura similar em forma de anel. Mas a nova imagem ALMA, mostrando o local onde as partículas maiores, com tamanhos da ordem do milímetro, se encontravam era muito diferente!

“Ao princípio, a forma da poeira na imagem apanhou-nos completamente desprevenidos”, diz van der Marel. “Em vez do anel que esperávamos ver, encontrámos uma forma muito clara em caju! Tivemos que nos convencer que o que estávamos a ver era bem real, mas o sinal forte e a nitidez das observações ALMA não deixavam margem para dúvidas. Foi aí que nos demos conta do que tínhamos descoberto”.

Imagem anotada obtida pelo Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), que mostra a armadilha de poeira situada no disco que circunda o sistema Oph-IRS 48. Esta armadilha de poeira dá às minúsculas rochas do disco um porto seguro onde se podem aglutinar e crescer até atingir o tamanho necessário para poderem sobreviver por si mesmas. A região verde corresponde à armadilha de poeira, onde se acumulam as partículas maiores. O tamanho da órbita de Netuno pode ser visto no canto superior esquerdo desenhado em escala. Crédito: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)/Nienke van der Marel
Imagem anotada obtida pelo Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), que mostra a armadilha de poeira situada no disco que circunda o sistema Oph-IRS 48. Esta armadilha de poeira dá às minúsculas rochas do disco um porto seguro onde se podem aglutinar e crescer até atingir o tamanho necessário para poderem sobreviver por si mesmas. A região verde corresponde à armadilha de poeira, onde se acumulam as partículas maiores. O tamanho da órbita de Netuno pode ser visto no canto superior esquerdo desenhado em escala.
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ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)/Nienke van der Marel

O que tinha sido descoberto era uma região onde os grãos de poeira maiores se encontravam presos e podiam crescer muito mais ao colidir e aglutinar-se uns com os outros. Era uma armadilha de poeira – exatamente o que os teóricos procuravam.

Como van der Marel explica: “Provavelmente estamos a ver um tipo de fábrica de cometas, já que as condições são propícias aos crescimento das partículas, desde o milímetro até ao tamanho de cometas. Não é provável que a poeira dê origem a planetas a esta distância da estrela. Mas num futuro muito próximo, o ALMA será capaz de observar estas armadilhas de poeira muito mais próximas das estrelas progenitoras, onde os mesmos fenômenos estão ocorrendo. Tais locais seriam efetivamente os berços de planetas recém nascidos”.

Uma armadilha de poeira forma-se quando partículas de poeira grandes se movem em direção a regiões de alta pressão. Os modelos de computador mostram que tais regiões de alta pressão podem ter origem nos movimentos do gás situado na periferia de um buraco de gás – tal como o encontrado neste disco.

Este mapa mostra a grande constelação de Ofiúco (ou Serpentário). Estão assinaladas a maioria das estrelas visíveis a olho nu num céu escuro e límpido. A localização do sistema Oph-IRS 48 está marcada com uma circunferência vermelha. Crédito: ESO, IAU and Sky & Telescope
Este mapa mostra a grande constelação de Ofiúco (ou Serpentário). Estão assinaladas a maioria das estrelas visíveis a olho nu num céu escuro e límpido. A localização do sistema Oph-IRS 48 está marcada com uma circunferência vermelha.
Crédito:
ESO, IAU and Sky & Telescope

“A combinação de modelizações com observações do ALMA de alta qualidade tornam este projeto único”, diz Cornellis Dullemond do Instituto de Astrofísica Teórica em Heidelberg, Alemanha, um especialista em modelizações de discos e evolução de poeira, e membro da equipe. “Na altura em que estas observações estavam a ser feitas, estávamos nós precisamente a trabalhar em modelos que prediziam exatamente este tipo de estruturas: uma coincidência muito feliz”.

As observações foram feitas quando o ALMA ainda se encontrava em construção. A equipe usou os receptores da Banda 9 do ALMA [3] – aparelhos feitos na Europa que permitem ao ALMA obter imagens extremamente nítidas.

“Estas observações mostram que o ALMA é capaz de nos dar ciência verdadeiramente original, e isto quando ainda operava com menos de metade da rede completa”, diz Ewine van Dishoeck do Observatório de Leiden, uma pessoa que tem contribuído de forma decisiva no projeto ALMA ao longo de mais de 20 anos. “Este incrível salto tanto em sensibilidade como em nitidez de imagem na Banda 9, dá-nos a oportunidade de estudar os aspectos básicos da formação planetária de maneiras que anteriormente não eram simplesmente possíveis”.

Notas

[1] A origem da armadilha de poeira, que neste caso é um vórtice no gás do disco, tem um tempo de vida médio de algumas centenas de milhares de anos. Apesar disso, mesmo quando a armadilha de poeira já não funciona, a poeira acumulada na armadilha demorará milhões de anos a dispersar-se, o que dá ainda imenso tempo aos grãos de poeira para crescerem mais.

[2] Este nome é uma combinação do nome da constelação da região de formação estelar onde o sistema foi encontrado e do tipo de fonte, ou seja, Oph corresponde à constelação de Ofiúco (ou Serpentário), e IRS significa fonte infravermelha. A distância da Terra a Oph-IRS 48 é cerca de 400 anos-luz.

[3] O ALMA pode observar em diferentes bandas de frequência. A Banda 9, que opera entre os 0,4 e os 0,5 milímetros, é o modo que até agora, tem fornecido as imagens mais nítidas.

Mais Informações

Este trabalho foi descrito no artigo científico “A major asymmetric dust trap in a transition disk“, de van der Marel et al., que será publicado a 7 de junho de 2013 na revista Science.

A equipe é composta por Nienke van der Marel (Observatório de Leiden, Leiden, Holanda), Ewine F. van Dishoeck (Observatório de Leiden; Max-Planck-Institut für Extraterrestrische Physik, Garching, Alemanha [MPE]), Simon Bruderer (MPE), Til Birnstiel (Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, Cambridge, EUA [CfA]), Paola Pinilla (Universidade de Heidelberg, Heidelberg, Alemanha), Cornelis P. Dullemond (Universidade de Heidelberg), Tim A. van Kempen (Observatório de Leiden; Joint ALMA Offices, Santiago, Chile), Markus Schmalzl (Observatório de Leiden), Joanna M. Brown (CfA), Gregory J. Herczeg (Instituto Kavli de Astronomia e Astrofísica, Universidade de Pequim, Pequim, China), Geoffrey S. Mathews (Observatório de Leiden) e Vincent Geers (Dublin Institute for Advanced Studies, Dublin, Irlanda).

O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a pesquisa em astronomia e é o observatório astronômico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronômicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrônomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação nas pesquisas astronômicas. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope, o observatório astronômico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio  ALMA, o maior projeto astronômico que existe atualmente. O ESO está planejando o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 39 metros que observará na banda do visível e infravermelho próximo. O E-ELT será “o maior olho no céu do mundo”.

Fonte:

http://www.eso.org/public/brazil/news/eso1325/

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Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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