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11 de dezembro de 2024

Descoberto Novo Odd Radio Circle Próximo ao Centro da Via Láctea: Kýklos

Os “Odd Radio Circles” (ORCs) representam um dos fenômenos mais intrigantes e recentes na astronomia moderna. Descobertos pela primeira vez em 2019 durante um levantamento conduzido pelo Australian Square Kilometer Array Pathfinder (ASKAP), esses anéis misteriosos de luz de rádio desafiam a compreensão convencional dos astrônomos. O que torna os ORCs particularmente fascinantes é sua invisibilidade em todos os comprimentos de onda, exceto no rádio, e a ausência de uma fonte óbvia que explique sua origem.

Os ORCs foram inicialmente identificados como estruturas circulares de rádio sem precedentes, e sua descoberta gerou um grande interesse na comunidade científica. A nomenclatura “Odd Radio Circles” reflete tanto sua forma circular quanto a natureza enigmática dessas estruturas. Até o momento, apenas um punhado de ORCs foi identificado, tornando cada nova descoberta uma oportunidade valiosa para aprofundar nosso entendimento sobre esses fenômenos.

O ASKAP, que é um precursor tecnológico do Square Kilometer Array (SKA), desempenhou um papel crucial na descoberta inicial dos ORCs. O SKA, quando concluído, será um gigantesco conjunto de radiotelescópios e antenas divididos entre a Austrália e a África do Sul, projetado para revolucionar a radioastronomia. A capacidade do ASKAP de detectar esses anéis de rádio únicos demonstra o potencial do SKA para futuras descobertas astronômicas.

A importância dos ORCs na astronomia moderna não pode ser subestimada. Eles representam uma nova classe de objetos astronômicos que desafiam as explicações tradicionais. A descoberta de ORCs sugere a existência de processos astrofísicos desconhecidos ou pouco compreendidos que podem ter implicações significativas para nossa compreensão do universo. Além disso, a investigação desses anéis pode fornecer insights valiosos sobre eventos catastróficos, como explosões de supernovas ou fusões de buracos negros supermassivos, que podem estar associados à formação dos ORCs.

Em resumo, os ORCs são uma adição recente e misteriosa ao catálogo de fenômenos astronômicos. Sua descoberta inicial pelo ASKAP abriu novas avenidas de pesquisa e destacou a importância da radioastronomia na exploração do cosmos. À medida que mais ORCs são descobertos e estudados, os astrônomos esperam desvendar os segredos por trás desses anéis enigmáticos e, assim, ampliar nosso conhecimento sobre os processos dinâmicos que moldam o universo.

Em novembro de 2022, uma equipe de astrônomos liderada por Cristobal Bordiu, do Observatório de Catania na Itália, fez uma descoberta intrigante utilizando o radiotelescópio MeerKAT, localizado no Parque Nacional Meerkat, na África do Sul. Durante suas observações, a equipe identificou um novo Odd Radio Circle (ORC), que foi catalogado como J1802–3353 e apelidado de Kýklos, uma palavra grega que significa “círculo”. Esta descoberta é particularmente notável porque Kýklos não se encaixa no padrão estabelecido pelos ORCs previamente conhecidos.

Os ORCs são estruturas misteriosas visíveis apenas em comprimentos de onda de rádio, e até agora, todos os ORCs descobertos estavam localizados em altas latitudes galácticas, ou seja, bem acima do plano da Via Láctea. Isso sugeria que esses ORCs eram ou muito próximos de nós dentro da nossa galáxia ou extragalácticos. No entanto, Kýklos foi encontrado apenas seis graus acima do plano galáctico, aparentemente muito próximo do centro da Via Láctea, que está a cerca de 26.000 anos-luz de distância. Essa localização anômala levanta questões sobre sua verdadeira distância e origem.

As características de Kýklos também são únicas. O anel tem um diâmetro de 80 segundos de arco no céu, com uma espessura de apenas 6 segundos de arco, formando um círculo quase perfeito. Além disso, o espectro de rádio de Kýklos é surpreendentemente plano, sem as linhas espectrais notáveis que são típicas de outros ORCs. Essa peculiaridade espectral sugere que Kýklos pode ser um tipo diferente de ORC, possivelmente relacionado a um fenômeno astrofísico ainda não completamente compreendido.

Para entender melhor a natureza de Kýklos, a equipe de Bordiu analisou dados do telescópio espacial Gaia da Agência Espacial Europeia. Gaia catalogou três galáxias que coincidem com a localização de Kýklos no céu, sendo uma delas apenas 3 segundos de arco distante do centro do anel. No entanto, se Kýklos fosse produzido por uma dessas galáxias, seria difícil explicar seu espectro plano, o que torna essa hipótese menos provável.

Se Kýklos não for extragaláctico, ele deve estar dentro da nossa Via Láctea, sugerindo uma origem estelar. No entanto, a ausência de raios-X e a falta de emissão óptica específica complicam a identificação de sua origem. A descoberta de Kýklos, portanto, não apenas desafia as teorias existentes sobre os ORCs, mas também abre novas possibilidades para a investigação de fenômenos astrofísicos desconhecidos.

A descoberta de Kýklos, um novo Odd Radio Circle (ORC), suscitou diversas hipóteses sobre sua origem, cada uma oferecendo uma perspectiva distinta sobre os fenômenos astrofísicos que poderiam ter gerado essa estrutura enigmática. Entre as principais teorias, destacam-se a possibilidade de Kýklos ser um remanescente de supernova, uma nebulosa planetária ou o resultado da atividade de uma estrela Wolf–Rayet.

Primeiramente, a hipótese de que Kýklos seja um remanescente de supernova é atraente devido à natureza circular comum a essas estruturas. Supernovas, explosões cataclísmicas de estrelas massivas, frequentemente produzem ondas de choque que colidem com o meio interestelar, criando nebulosas redondas. No entanto, supernovas também emitem raios-X, e nenhuma emissão de raios-X foi detectada proveniente de Kýklos. Além disso, embora vários pulsares (estrelas de nêutrons giratórias resultantes de supernovas) tenham sido identificados dentro do anel, a falta de dados de distância impede a confirmação de qualquer conexão direta com Kýklos.

Outra possibilidade é que Kýklos seja uma nebulosa planetária, que é a camada externa ejetada de uma estrela semelhante ao Sol em seus estágios finais de vida. Nebulosas planetárias tipicamente se expandem até cerca de 3 anos-luz antes de se dispersarem. Se Kýklos fosse uma nebulosa planetária, sua aparente largura de 80 segundos de arco no céu sugeriria que ela está relativamente próxima de nós. Contudo, nebulosas planetárias emitem luz óptica, especialmente na linha de emissão de hidrogênio-alfa, e nenhuma emissão óptica foi detectada de Kýklos, enfraquecendo essa hipótese.

A teoria mais promissora é que Kýklos seja o resultado da atividade de uma estrela Wolf–Rayet. Estas são estrelas massivas que perdem suas camadas externas através de ventos estelares intensos, criando estruturas nebulosas. A ausência de uma nebulosa visível não é problemática, pois os ventos rápidos dessas estrelas podem destruir a poeira próxima, deixando apenas poeira mais fria em regiões mais distantes, que emitiria em comprimentos de onda de 24 microns. Infelizmente, não há dados disponíveis nessa faixa para confirmar a presença de tal poeira. No entanto, o espectro plano de Kýklos é consistente com as características de uma estrela Wolf–Rayet, fortalecendo essa hipótese.

Embora uma estrela Wolf–Rayet ainda não tenha sido identificada dentro de Kýklos, há candidatos estelares, incluindo uma estrela azulada a 24.500 anos-luz de distância. Se esta estrela for a fonte de Kýklos, o anel teria aproximadamente 10 anos-luz de diâmetro. A falta de dados espectrais sobre esta estrela impede a confirmação de sua natureza como uma estrela Wolf–Rayet.

Para resolver este enigma, os próximos passos incluem observações detalhadas com o Telescópio Espacial James Webb, que poderá fornecer os dados espectrais necessários para identificar a estrela responsável e, assim, elucidar a verdadeira natureza de Kýklos.

A descoberta de Kýklos representa um avanço significativo na astrofísica, não apenas pela sua singularidade, mas também pelas questões que levanta sobre a formação e evolução de estruturas cósmicas. A identificação de um novo Odd Radio Circle (ORC) próximo ao centro da nossa galáxia desafia as teorias existentes sobre a origem desses fenômenos e abre novas possibilidades para a compreensão dos processos astrofísicos subjacentes.

Uma das principais implicações dessa descoberta é a necessidade de revisar os modelos atuais de formação de ORCs. Até agora, a maioria dos ORCs conhecidos estava localizada em altas latitudes galácticas, sugerindo uma origem extragaláctica ou em regiões periféricas da Via Láctea. Kýklos, por outro lado, está situado apenas seis graus acima do plano galáctico, o que sugere uma possível origem dentro da nossa própria galáxia. Isso implica que os mecanismos que geram ORCs podem ser mais variados e complexos do que se pensava anteriormente.

Além disso, a descoberta de Kýklos com um espectro plano e sem emissões notáveis em outras faixas de comprimento de onda levanta questões sobre a natureza dos processos físicos envolvidos. A hipótese de que Kýklos possa ser o resultado de uma estrela Wolf–Rayet em processo de perda de massa é intrigante, mas ainda carece de confirmação. A ausência de uma nebulosa visível associada e a falta de dados em comprimentos de onda específicos, como 24 microns, deixam essa hipótese em aberto.

Os próximos passos na pesquisa sobre Kýklos envolvem a utilização de instrumentos mais avançados, como o Telescópio Espacial James Webb (JWST). Com sua capacidade de observação em comprimentos de onda infravermelhos, o JWST poderá fornecer dados cruciais sobre a presença de poeira fria e outras características que possam confirmar ou refutar a hipótese da estrela Wolf–Rayet. A obtenção de espectros detalhados das estrelas candidatas dentro de Kýklos também será essencial para determinar sua natureza e possível conexão com o anel de rádio.

Essa investigação não só ajudará a esclarecer a origem de Kýklos, mas também contribuirá para uma compreensão mais ampla dos processos que governam a formação de ORCs. A possibilidade de que existam diferentes tipos de ORCs, cada um com mecanismos de formação distintos, pode levar a uma revisão das teorias atuais e à formulação de novos modelos astrofísicos.

Em última análise, a descoberta de Kýklos e a pesquisa subsequente têm o potencial de transformar nossa compreensão do universo. Ao explorar esses fenômenos misteriosos, os astrônomos não apenas desvendam os segredos das estrelas e galáxias, mas também avançam no conhecimento sobre a estrutura e a evolução do cosmos. A jornada para decifrar Kýklos está apenas começando, e as descobertas futuras prometem ser tão fascinantes quanto desafiadoras.

Fonte:

https://www.livescience.com/space/astronomy/astronomers-discover-new-odd-radio-circle-near-the-center-of-our-galaxy

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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