Por Yara Laiz Souza
Uma nuvem molecular gigantesca, certa vez, colapsou seu centro sobre si mesma formando uma protoestrela brilhante. Ao seu redor, um extenso anel opaco de gás e poeira, chamado de disco protoplanetário, começou a se formar. A partir de então, planetas rochosos com períodos orbitais que variavam entre 88 a 687 dias e planetas gasosos com períodos orbitais que variam de 12 a 165 anos começaram a se formar. Estes planetas estão, hoje, orbitando uma estrela experiente, o Sol, e mandamos sondas para visitar esses mundos. Esta é a versão que ouviu desde sempre, mas essa versão não faz mais tanto sentido há 20 anos. Bem vindo à crise do modelo do sistema solar, uma das importantes corridas no mundo da Astronomia para tentar entender de uma vez por todas como o nosso sistema nasceu.
Geralmente, utilizamos Júpiter para explicar a conformidade do nosso sistema solar. A história de Júpiter envolve basicamente o seu nascimento além do cinturão de asteroides. Ele começou a crescer bem rápido juntamente com o seu campo gravitacional agregando a maior parte de gás, gelo e poeira disponíveis. A partir do momento em que Júpiter tomou a sua forma, o sistema solar começou a mudar. Os corpos além do planeta começaram acrescer mais devagar e os que estavam antes de Júpiter eram ainda menores visto que havia pouco gás e poeira disponíveis.
Há 20 anos, quando exoplanetas começaram a ser descobertos em outros locais do Universo, astrônomos puderam ver mais na prática todos os estudos envolvendo a formação do Sistema Solar. E, surpresos, viram que podem estar bastante enganados: a maioria dos exoplanetas encontrados na época eram “Júpiteres quentes”, planetas gasosos imensos que estavam absurdamente pertos demais de suas estrelas. No início, os astrônomos achavam que, de alguma forma, esses planetas tinham se formado em outro local do sistema e migrado para mais perto da estrela. Agora, as conclusões são de que sistemas planetários como o nosso são inteiramente raros. Eles perceberam que a presença de planetas do tamanho e porte de Júpiter e Saturno existem em apenas 10% das estrelas.
A teoria clássica de formação planetária apresenta falhas que não conseguem explicar algumas questões. Por exemplo, qual a razão da região interna do sistema solar ter apenas planetas rochosos nanicos ao invés de superterras? E por qual motivo as órbitas dos planetas gigantes são tão estáveis e extensas?
A influência de um planeta que cresce demais pode gerar pontos positivos e negativos nos mundos ao redor. Ocorre também a migração planetária tendo as linhas de gelo como papel significativo para a moldagem do sistema. A presença de gigantes gasosos tira das linhas de gelo essa responsabilidade e eles começam uma viagem para mais próximo de sua estrela. Isso é o que ocorre em outros sistemas. No nosso, Júpiter e Saturno estão longe demais. Por que aqui esse processo não ocorreu?
Um modelo interessante, finalizado em 2011, é o Grand Tack (ou Grande Ataque). Júpiter e Saturno começaram a interagir entre si. Essa interação gerava efeitos gravitacionais amplificados em tudo o que estava ao redor. Eles começaram a lançar seus pesos contra o disco protoplanetário fazendo com que ficassem mais distantes entre si com Júpiter mais perto e Saturno mais longe do Sol. Júpiter, por ter mais massa, exerceu mais força gravitacional no disco interno de gás e poeira do que Saturno e, dessa forma, eles começaram a se afastar do Sol.
Essa atividade de se aproximar e depois se afastar do Sol provocou uma desordem catastrófica. Planetesimais colidiram uns com os outros de forma violenta a cada instante sendo reduzidos a migalhas cósmicas. Estas migalhas espiralavam ao redor do Sol deixando apenas alguns mais sortudos inteiros. Alguns anéis de escombros foram formados na linha tênue dos, hoje, quatro planetas rochosos do nosso sistema.
A ‘loteria’ do sistema solar teve um final digno de drama: o Bombardeio Passado Tardio foi um verdadeiro ‘deus nos acuda’ acontecido entre 4,1 e 3,8 bilhões de anos atrás. As cicatrizes desse período de violência extrema de colisões são facilmente encontradas na nossa Lua, uma sobrevivente cheia de cicatrizes. Além disso, alguns mundos podem ter sido expulsos do nosso sistema e a postulação do Planeta Nove pode ser uma das provas dessa época insana.
Ainda há muitas lacunas para serem respondidas sobre a origem do nosso sistema. Se não fosse pelo Grand Tack, nosso sistema seria um sistema planetário semelhante aos encontrados em outros locais do Universo. A crise de tudo o que sabemos sobre o assunto pode ser a grande oportunidade para expandir nossos conhecimentos e de abrir mais uma pergunta: se o nosso sistema for mesmo raro, a geração vida pode estar intrinsecamente ligado a sistemas semelhantes ao nosso? Seria um afunilamento interessante para responder a essa dúvida que atormenta a muitos e fazem outros sonharem com possibilidades sem limites de vidas e mundos.
Sugestão de leitura: “Filhos do Caos”, texto da edição número 168 da revista Scientific American Brasil