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22 de novembro de 2024

O VLT do ESO Descobre uma Super-Estrela Brilhante mas Solitária

Uma estrela extraordinariamente brilhante, porém isolada, foi encontrada numa galáxia próxima – a estrela é três milhões de vezes mais brilhante que o Sol. Todas as “super-estrelas” anteriormente descobertas foram encontradas em aglomerados estelares, mas este farol brilha com um esplendor solitário. A origem desta estrela é misteriosa: será que se formou isolada ou foi ejetada de um aglomerado? Qualquer destas hipóteses põe à prova o conhecimento dos astrônomos sobre a formação estelar.

Uma equipe internacional de astrônomos [1] utilizou o Very Large Telescope do ESO para estudar detalhadamente a estrela VFTS 682 [2] situada na Grande Nuvem de Magalhães, uma pequena galáxia vizinha da Via Láctea. Ao analisar a radiação da estrela, com o instrumento FLAMES do VLT, descobriu-se que esta estrela possui 150 vezes mais massa do que o Sol. Até agora estrelas como esta só tinham sido encontradas nos centros muito densos de aglomerados estelares, mas a VFTS 682 encontra-se isolada.

“Ficamos muito surpreendidos por encontrar uma estrela de tão grande massa isolada, em vez de se encontrar situada num aglomerado estelar rico,” diz Joachim Bestenlehner, o autor principal deste novo estudo, estudante do Observatório de Armagh, na Irlanda do Norte. “A sua origem é misteriosa.”

Esta estrela foi inicialmente descoberta numa busca efetuada nas estrelas mais brilhantes situadas no interior e em volta da Nebulosa da Tarântula, na Grande Nuvem de Magalhães. A estrela situa-se numa maternidade estelar: uma enorme região de gás, poeira e estrelas jovens, que é, na realidade, a região de formação estelar mais ativa no Grupo Local de galáxias [3]. Inicialmente pensou-se que a VFTS 682 fosse quente, jovem e brilhante, sem no entanto possuir características especiais. Contudo, este novo estudo feito com o VLT revelou que muita da energia da estrela está a ser absorvida e dispersada por nuvens de poeira antes de chegar à Terra – ou seja, a estrela é na realidade mais brilhante do que o que se pensava anteriormente, encontrando-se mesmo entre as estrelas mais brilhantes conhecidas.


A radiação vermelha e infravermelha emitida pela estrela atravessa a poeira, mas a radiação azul e verde, de menor comprimento de onda, é dispersada e consequentemente perdida. O resultado disto é que a estrela aparece-nos mais avermelhada do que é na realidade. Se a víssemos completamente livre de obstruções ela brilharia num tom azul-branco luminoso.

Além de ser extremamente brilhante, a VFTS 682 é também muito quente, com uma temperatura em sua superfície de cerca de 50 000 graus Celsius [4]. Estrelas com tão estranhas propriedades podem acabar as suas curtas vidas não apenas como supernovas, como é normal para estrelas de grande massa, mas possivelmente como as mais dramáticas explosões de raios gama de longa duração [5], as explosões mais brilhantes no Universo.

Embora a VFTS 682 pareça estar atualmente sozinha, não se encontra muito afastada do aglomerado estelar muito rico RMC 136 (muitas vezes chamado apenas R 136), que contém várias “super-estrelas” semelhantes (eso1030) [6].

“Os novos resultados mostram que a VFTS 682 é praticamente idêntica a uma das super-estrelas mais brilhantes situada no coração do aglomerado estelar R 136,” acrescenta Paco Najarro, outro membro da equipa do CAB (INTA-CSIC, Espanha).

Será possível que a VFTS 682 tenha sido formada neste aglomerado e posteriormente ejetada? Tais “estrelas fugitivas” são conhecidas dos astrônomos, mas todas as que se conhecem são meores que a VFTS 682. Seria por isso interessante descobrir como é que uma estrela de tão grande massa poderia ser lançada para fora do aglomerdo por interações gravitacionais.

“Parece mais fácil formar as estrelas maiores e mais brilhantes no interior de aglomerados estelares ricos,” acrescenta Jorick Vink, outro membro da equipe. “ E embora seja possível, é muito mais difícil compreender como é que estes faróis brilhantes se formam sozinhos. O que torna a VFTS 682 verdadeiramente fascinante.”

Notas

[1] O estudo da VFTS 682 foi liderado por Jorick Vink, Götz Gräfener e Joachim Bestenlehner do  Armagh Observatory.

[2] O nome VFTS é o acrônimo do inglês de VLT-FLAMES Tarantula Survey, uma busca efetuada pelo instrumento FLAMES do VLT na região da nebulosa da Tarântula, um programa do ESO liderado por Christopher Evans do UK Astronomy Technology Centre, Edinburgh, Reino Unido.

[3] O Grupo Local é um pequeno grupo de galáxias, que inclui as galáxias da Via Láctea e da Andrômeda, assim como as Nuvens de Magalhães e muitas outras galáxias menores.

[4] Em termos de comparação a temperatura na superfície do Sol é cerca de 5500 graus Celsius.

[5] As explosões de raios gama estão entre os eventos mais energéticos do Universo e a radiação de alta energia que produzem pode ser detectada por sondas espaciais orbitais. As explosões de raios gama que duram mais que dois segundos são as chamadas explosões longas e as que têm uma duração menor são conhecidas como explosões curtas. As explosões longas estão associadas com explosões de supernova de estrelas jovens de elevada massa em galáxias com formação estelar. As explosões curtas não são bem compreendidas, mas pensa-se que tenham origem na fusão de dois objetos compactos tais como estrelas de nêutrons.

[6] Se a VFTS 682 se encontrar à mesma distância da Terra do que a R 136, então a sua distância ao centro do aglomerado é cerca de 90 anos-luz. Se as distâncias forem significativamente diferentes a separação pode ser muito maior.

Mais Informação

Este trabalho foi apresentado num artigo científico, “The VLT-FLAMES Tarantula Survey III: A very massive star in apparent isolation from the massive cluster R136”, que será publicado na revista especializada Astronomy & Astrophysics.

A equipa é composta por Joachim M. Bestenlehner (Armagh Observatory, Reino Unido), Jorick S.Vink (Armagh), G. Gräfener (Armagh), F. Najarro (Centro de Astrobiologia, Madrid, Espanha), C. J. Evans (UK Astronomy Technology Centre, Edinburgh, Reino Unido), N. Bastian (Excellence Cluster Universe, Garching, Alemanha; University of Exeter, Reino Unido), A. Z. Bonanos (Observatório National de Atenas, Grécia), E. Bressert (Exeter; ESO; Harvard Smithsonian Center for Astrophysics, Cambridge, Estados Unidos), P. A. Crowther (University of Sheffield, Reino Unido), E. Doran (Sheffield), K. Friedrich (Instituto Argelander, Universidade de Bonn, Alemanha), V.Hénault-Brunet (University of Edinburgh, Reino Unido), A. Herrero (Universidade de La Laguna, Tenerife, Espanha; ESO), A. de Koter (Universidade de Amsterdam; Universidade de Utrecht, Holanda), N. Langer (Argelander Institute), D. J. Lennon (ESA; Space Telescope Science Institute, Baltimore, Estados Unidos), J. Maíz Apellániz (Instituto de Astrofísica de Andalucia, Granada, Espanha), H. Sana (Universidade de Amsterdam, Holanda), I. Soszynski (Universidade de Varsóvia, Polónia), e W. D. Taylor (University of Edinburgh).

O ESO, o Observatório Europeu do Sul, é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronômico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 14 países: Áustria, Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Itália, Holanda, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronômicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrônomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronômica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Telescópio Muito Grande (VLT), o observatório astronômico, no visível, mais avançado do mundo e o VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio  ALMA, o maior projeto astronômico que existe atualmente. O ESO está planejando o Telescópio Europeu Extremamente Grande, E-ELT, um telescópio de 42 metros que observará na banda do visível e infravermelho próximo. O E-ELT será “o maior olho no céu do mundo”.

Fonte:

http://www.eso.org/public/news/eso1117/

 

Sérgio Sacani

Formado em geofísica pelo IAG da USP, mestre em engenharia do petróleo pela UNICAMP e doutor em geociências pela UNICAMP. Sérgio está à frente do Space Today, o maior canal de notícias sobre astronomia do Brasil.

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